terça-feira, 29 de outubro de 2013

Isabel Saraiva Comunicação


Comunicação no diálogo com os Artistas presentes no Congresso da Mulher Migrante

Palácio das Necessidades - Lisboa – 2013

24/25 outubro

“ Uma ponte entre Porto e Nagasaki “

Todo o rio e toda a ponte traduzem-se para mim em fascínio.

Todas as pessoas gostam de caminhar por cima da água, pois existe uma dimensão metafísica.

As pontes têm um valor utilitário, estético, lúdico e podem inclusivé serem um lugar de encontro e de confluência.

A ponte liga, une, nunca separa.

Tenho um encantamento por pontes, sobretudo aquelas que passam por cima da água.

Poderia afirmar que há mais de uma década sou toda água.

A água para mim é um núcleo da criatividade, pois salto da minha zona de conforto, a terra.

A mulher portuguesa é uma mulher forte, criativa e que ultrapassa as dificuldades tanto dentro como fora do país.

A minha obra tem percorrido a diáspora. É uma ponte que desenho com outras culturas e outros saberes.

O Porto, minha terra natal e onde vivo, convive harmoniosamente com 6 Pontes de grande beleza e audácia.

Os rios e principalmente o Douro, na sua foz exala qualidades para mim quase míticas de segredos bem guardados de vida secreta do mundo inferior.

Olho o rio e pela minha mente passam cores. Desde os tons de azul celeste, pêntalo, cobalto, índigo, conzas, passando aos verdes lodosos, rosas pálidos e brancos.

Estes últimos pertencem certamente a seres que se lançaram nas águas em busca de segredos ocultos nas ‘barcas’ da passagem.

Nos trabalhos que estou a elaborar, deixei-me enlevar quase numa atitude hipnótica e entusiasmante pela curvatura do arco. Desvalorizei quase por completo outros elementos que compõem a obra de arte aproximando-se à feminilidade da mulher – o esplendor da sua gravidez.

Certamente que às vezes sinto-me à deriva e questiono-me sobre o rumo criativo a tomar quanto ao tema, pois o plasmo há anos.

Contudo, o fascínio assiste-me e a força energética benéfica e forte que me faz pulsar o coração, faz com que o meu olhar seja autónomo desprendendo-se do meu ‘eu’ e religue-se a outras descobertas por vezes enigmáticas e imaginadas da graça e beleza da linha.

De olhos bem abertos e sozinha, recrio no silêncio do atelier apenas com o som das gaivotas e dos pássaros e tendo apenas como companheiro o imaginário, recrio arcos e arcos de pontes.

Partindo deste pressuposto, desenhei um arco de ponte tendo como objetivo a exploração de um mundo distante – o país do sol nascente – o Japão.

Surgiu-me assim uma luz quanto à história de uma civilização distante mas ao alcance da minha mão, desenhando apenas um arco de união. Um rumo inesperado da mente conduziu-me a uma direção que parecia não existir no dia anterior. Um encontro com outro imaginário que explorei com métodos e metodologias interpretativas que se iriam aproximar de outro sentir do espírito humano.

Assim, surgiu o haiku escrito em haikai no ano que o Porto celebra 35 anos de geminação com Nagasaki e 470 anos de amizade Portugal/Japão.

Foi um trabalho árduo em direção ao insondável com imprevistos, recomeços, descobertas e recaídas na sua escrita.

Desejava também eu, através da escrita, evidenciar a natureza reflexiva quase meditativa que os haikus nipónicos nos oferecem assim como a fluidez da sua pintura.

Abeirei-me deste trabalho plástico e poético com humildade e timidez mas com insistência em tatear este rumo ainda muito desconhecido.

Trabalhei em territórios estranhos para mim, especialmente quanto à forma da escrita. No final, surgiu o meu livro ‘Juncos Oscilam  Breviário do Espanto’, que já se encontra no Japão.

Fui uma viajante, tanto no sentido literal como no sentido figurado, na aproximação a uma cultura que me fascina.

O meu espírito ao terminar os meus poemas ligou-se com a serenidade, a transparência e também ao ato reflexivo que os haikus nipónicos nos comunicam. De certa forma os meus igualmente tocam no entender do Prof. Albano Martins o mesmo sentimento quando afirma no seu texto “… deixam transparecer uma delicadeza que se casa bem com o espírito do haiku japonês, o espírito zen”.

Igualmente, o Dr. Miguel Cadilhe acrescenta no seu início do seu comentário, “… que este pequeno breviário serviria para ler, reler e meditar.”

 

 

Numa manhã de Agosto

a bomba calou a andorinha

que cantava em Ariake

 

 

原爆が         GENBAKU GA

有明つばめの        ARIAKE TSUBAME NO

歌を奪ひき         UTA O UBAIKI

 

 

Toda a Humanidade é um núcleo e em conjunto, nos religamos em sintonia e união com o Cosmos…

 

Isabel Saraiva, em 15.10.2013

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