quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Maria Beatriz Rocha Trindade

DA MALA DE CARTÃO AO DIPLOMA UNIVERSITÁRIO
UM RÁPIDO OLHAR SOBRE A SITUAÇÃO EMIGRATÓRIA EM PORTUGAL
O título escolhido é provocador, podendo ser considerado como estereótipo enganoso, que
não traduz a realidade actual mas só uma parte dela. A sua natureza "chamativa" atrai a
atenção dos que superficialmente abordam assuntos como este - a emigração portuguesa -
que requer uma atenção mais profunda, se se pretende sobre eles obter um conhecimento
actualizado e objectivo. Tendo a expressão sido utilizada, frequentemente, como indicador do
que a caracteriza nos nossos dias, não esgota nem sintetiza a sua definição e pode conduzir a
interpretações parcelares.
As extrapolações são sempre perigosas, devendo ser evitadas considerações ligeiras que
atingem apenas uma parte da população alvo, sem ter em conta o conjunto das variáveis
intervenientes, cuja consideração se torna indispensável. No presente, falar em "mala de
cartão" remete para uma etapa da migração intraeuropeia, cujas características difíceis então
vividas conseguiram ser ultrapassadas; do mesmo modo, referir o "diploma universitário"
contempla apenas um segmento dos fluxos migratórios actuais que apenas integram parte
dos elementos que o possuem. Uma e outra das expressões cobrem realidades segmentárias
sem traduzir a totalidade da realidade complexa que a elas subjaz. Impõe-se, por isso, que um
breve olhar retrospectivo seja lançado sobre o percurso histórico que as antecede, de forma a
dar continuidade e fazer compreender o contexto presente.
A mobilidade constitui desde sempre uma das características da demografia portuguesa,
situação que ocorre pela posição geográfica em que o país se encontra e pelas condições
de desenvolvimento insuficiente que sempre o caracterizaram e o caracterizam. Nunca
tendo conseguido manter dentro das suas próprias fronteiras a totalidade da população
residente, que assim se viu obrigada a procurar fora delas melhores condições de vida, esta
especificidade própria da sua estrutura foi-se alterando de acordo com a modificação das
situações conjunturais internacionais, que em cada tempo se articulam de forma diferenciada
com as nacionais. Alteram-se assim os destinos dos que partem, as condições em que o fazem,
o número e a composição que integra cada um dos fluxos migratórios.
Nem sempre se tem querido ver as condições reais que, de uma forma ou de outra, motivam
a partir; as situações em que ocorrem as saídas; quem integra as correntes migratórias, o
volume que cada uma delas assume; o sofrimento que acompanha o afastamento físico dos
que se deixaram; enfim, tudo o que faz deslocar os nacionais do seu próprio país para um
outro que não é seu. Em síntese, não querendo reconhecer as condições tão desfavoráveis que
sempre têm ocorrido, surgem razões em forma de justificação que procuram explicar de modo
simplista e desadequado este contínuo movimento de gentes. Entre elas, lembre-se o tão
invocado "espírito de aventura", considerado como próprio dos Lusitanos, que fez descobrir
novos territórios em vários continentes, que levou a trabalhar em minas, na agricultura
e na construção civil, tudo numa tentativa de desresponsabilização política. À travessia
transoceânica seguiram-se os caminhos pela Europa que levam à diversidade de destinos onde
se encontram hoje os mais de 5 milhões e 500 mil homens e mulheres de origem portuguesa.
Maria Beatriz Rocha-Trindade
Novembro 2012
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Estes
Portugueses
integram
uma
grande diáspora – a
Diáspora Portuguesa –
porque vivendo longe do
país reclamam a ele
pertencer
-
uma
origem
assumida
sem
vergonha
e
fazem-
no
com
orgulho,
demonstrado
publicamente.
Os
valores que evocam constituem guião do seu modo de viver e muitos dos muitos elementos
da herança cultural que transportam por legado de ascendência é transmitido às gerações
mais novas que os recriam e enriquecem.
Portugal nunca interrompeu a sua emigração e embora tenha decrescido o número de
emigrantes durante o período que se situa após a Revolução dos Cravos (Abril de 1974) vem a
adquirir de novo a pujança que a caracterizou no início da segunda metade do século passado.
Não pode dizer-se que a actual pode ser comparável à que teve lugar nesse período, uma vez
que a composição de uma e de outra é diferente. Em vez de uma mão-de-obra não qualificada,
desejada pelos países do Centro e do Norte da Europa, para a reconstrução que se impunha,
os que hoje saem de Portugal têm uma preparação muito diversa em que, naturalmente
muitos dos elementos possuem uma maior qualificação académica, uma vez que Portugal foi
capaz de oferecê-la aos jovens nestes últimos anos. A falta de oportunidades e o desemprego
que ocorre numa linha contínua e crescente é responsável pela situação que ocorre. Para além
disso, um grande número de mulheres integra os fluxos que se dirigem para países muito mais
diversificados, embora os tradicionalmente procurados continuem a atrair os que saem do
país.
Nunca
será
de
mais
lembrar que as condições de
comunicação
permitem
a
circulação
da
informação e encurtam as
distâncias. O que era longe e
difícil
tornou-se
acessível.
Os meios de transporte com
preços
competitivos
facilitaram a circulação. E,
para
além
disso,
muitos
núcleos de compatriotas ou gente com quem anteriormente se mantinha uma relação familiar
ou de vizinhança constitui não só um incentivo para a partida como um ponto de apoio para a
primeira fixação, que pode até assumir-se como de carácter ilegal numa primeira fase.
Maria Beatriz Rocha-Trindade
Novembro 2012
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A leitura dos jornais, semanários e diários, as notícias emitidas pela rádio ou visionadas na
televisão, a consulta on line, dão conta do número de anúncios que publicitam a existência de
postos de trabalho livres em países estrangeiros. O mesmo acontece com feiras de emprego
organizadas em Portugal, onde numerosos recrutadores estrangeiros instalados em stands,
concorrem entre si através de intermediários ou de modo directo, oferecendo condições de
trabalho tentadoras, pela estabilidade assegurada, salário atractivo e ensino de língua entre
outras ofertas vantajosas e aliciantes. Todos eles referem a necessidade de uma mão-de-obra
qualificada a nível académico ou outro.
Entre a primeira destaca-
se a área da saúde
(médicos,
dentistas,
enfermeiros, farmacêuticos)
e da engenharia civil e
arquitectura.
No
entanto,
não
pode
esquecer-se que muitas
outras relacionadas com a
prestação
de
serviços
(de
que
a
restauração constitui um
bom
exemplo)
recrutam Portugueses. Torna-se importante salientar que o interesse demonstrado pelos
trabalhadores de nacionalidade portuguesa reflete o apreço em que é tido o seu trabalho,
sendo a qualidade reconhecida a nível internacional.
A presença portuguesa em todo o mundo é um facto indiscutível. Embora a diversidade se
instale, os tradicionais destinos da sua emigração avolumam-se: Brasil e França, constituem os
dois pólos eleitos, visivelmente recortados, o primeiro revelando a preferência transoceânica
e o segundoo, uma preferência além-Pirinéus. O maior número dos que são de origem
portuguesa reside nos Estados Unidos da América.
Novos
caminhos
se
abriram - uns retrocedendo,
como
foi
o
caso
de
Espanha, outros progredindo
como é o caso de Angola.
Portugal continuará a ser um
país de migrações sem fim, como
afirmou em 1999, Manuela Aguiar.
O projecto de regresso por
muitos
imaginado
como
definitivo assume hoje várias
formas, traduzidas por movimentos pendulares cujo espaço se encurta e o ritmo se acelera.
Maria Beatriz Rocha-Trindade
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Através das facilidades tecnológicas que transportam os que estão longe para mais perto e
permitem com eles estabelecer um permanente convívio as saudades menorizam-se.
O futuro trará certamente novas configurações a esta mobilidade que nunca deixará de levar
para fora do território os elementos de uma nação sem fronteiras físicas que, através de fortes
laços emocionais, assegura uma presença que se estende a todo o mundo e nele deixa as
marcas produzidas pelo seu sentimento de pertença.
Maria Beatriz Rocha-Trindade
Universidade Aberta - CEMRI
Maria Beatriz Rocha-Trindade
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