Estou muito grato por este convite, que muito me honra. Faria os impossíveis para estar presente neste encontro,
> porque considero esta iniciativa notável. Queria, sobretudo, e > antes de mais, dirigir aos participantes umas
> palavras de encorajamento. O programa, que tenho à minha minha frente, vai ser interessantíssimo!
> Embora não possa ficar por muito tempo, depois desta cerimónia > de abertura, o que lamento, pois tenho a certeza que os debates > serão excelentes, para já, foi para mim extremamente enriquecedor ter tido oportunidade de trocar impressões com a Dr.ª Manuela Aguiar e com a Dr.ª Manuela Marujo sobre vários temas do maior interesse
> para a nossa colectividade, a nossa comunidade de Toronto e do > Ontário.
> Espero que haja, depois, uma publicação das intervenções, que prometem ser enriquecedoras, e por certo me facultarão uma cópia nem que seja por mail - meio mais fácil - para meu uso, dos funcionários que no Consulado-Geral se ocupam de questões sociais e para eventual divulgação junto dos que se ocupam de questões sociais e estão ligados à nossa Comunidade.
> Uma vez mais, muito obrigado pelo convite e por esta honra inesperada de me terem dado o microfone em primeiro lugar.
> Muito obrigado.
>
A ASSOCIAÇÃO "MULHER MIGRANTE" ABRE ESTA TERTÚLIA A CONVERSA SOBRE AS MIGRAÇÕES E AS DIÁSPORAS PORTUGUESA E LUSÓFONAS. VAMOS FALAR DA NOSSA ASSOCIAÇÃO, DAS INICIATIVAS QUE ESTAMOS A DESENVOLVER E DA FORMA COMO PODEM COLABORAR CONNOSCO. UM CONVITE DIRIGIDO, POR IGUAL, A MULHERES E HOMENS, DE TODAS AS IDADES, EM TODAS AS LATITUDES.
segunda-feira, 22 de dezembro de 2014
quarta-feira, 17 de dezembro de 2014
O encontro de jovens - S. José/ Berkeley e Espinho
9 de julho de 2014
Na biblioteca Municipal José Marmelo e Silva, os estudantes, orientados pela Drª Carminda
Costa e Dr. João Paulo Reis, professores da Escola Secundária, Dr Manuel Gomes de Almeida
e Dr Manuel Gomes de Almeida, respetivamente, aguardavam os alunos luso descendentes,
acompanhados pela Professora de Literatura e Língua Portuguesa da Universidade de S. José e
Berkeley, Deolinda Adão.
Atravessaram o oceano para chegar a terras do Luso para estudarem in loco as tradições , a
cultura e a língua que tanto desejam estudar. Os estudantes de Espinho aguardavam ansiosos
o momento, não escondendo a responsabilidade de serem os anfitriões e animadores de uma
sessão que tinham preparado cuidadosamente, sobre literatura e língua portuguesa.
Leonor Fonseca, vereadora da Câmara Municipal, também esteve presente e deu as boas-
vindas ao grupo de jovens das duas Escolas Secundárias de Espinho e aos jovens universitários
americanos e à sua Professora, Deolinda Adão. Agradeceu à Associação de Estudo,
Cooperação e Solidariedade – Mulher Migrante, promotora desta iniciativa de ligação de
jovens dos dois continentes, por ter inserido Espinho no roteiro da sua visita a Portugal,
durante as oito semanas dedicadas ao estudo da cultura e da língua portuguesa. Destacou a
importância simbólica deste encontro, no ano da celebração dos 800 anos da existência da
língua portuguesa e elogiou o empenho que as escolas deste concelho têm, merecedoras de
grande admiração.
O início dos trabalhos do workshop organizado pelos alunos, desenrolou-se durante as horas
seguintes. A sessão foi embalada com música de fundo com o tema “ Canção do mar “
interpretado por Dulce Pontes, esse mar simbolicamente representado por um extenso pano
azul a unir as 5 mesas dos grupos de trabalho, representando, desta forma, os 5 continentes
que o mar une, mais do que separa.
Os alunos Miriam Rendeiro, Ana Carolina Reis, Carolina Marques, Filipe Lopes, Gonçalo
Sabença, Andreia Ferreira, Beatriz Santos, Emeline Amorim, Maria João Cruz e Alexandra
Romão foram apoiados pelos seus professores Carminda Costa e João Paulo Reis, na seleção
dos textos. Os professores orgulhosos do trabalho dos seus alunos revelaram que o grupo se
organizou de forma autónoma e criativa, programando a magnífica apresentação sobre a
língua e cultura portuguesa. A escolha de textos da “Mensagem” de Fernando Pessoa,
representativos da divisão do poema - nascer, crescer, morrer e ressuscitar, o poema de
Jorge de Palma, “ Portugal, Portugal” e “ O Portugal Futuro” de Ruy Belo, foram lidos,
contextualizados, interpretados, seguindo-se propostas de trabalho, desde jogos de palavras
para completar poemas, com apoio a ilustrações, propostas de dramatização que os jovens
americanos acolheram de forma muito entusiasta.
Estivemos perante uma sessão de ensino/aprendizagem muito peculiar, tratou-se de uma
aula viva e criativa, momentos de homenagem à nossa língua em data de celebração dos cem
anos. Toda a sessão foi acompanhada pela ilustração, ao vivo, por alunos de artes, Joana
Bastos e Guilherme Peres. Também eles foram autores, juntamente com Miriam Rendeiro,
orientados pela Professora de Artes, da Escola Secundária Dr. Manuel Gomes de Almeida,
Aurora Bernardo, das magnificas ilustrações alusivas aos poemas apresentados que foram
compilados em forma de dossiê e ofertados aos jovens outro lado do mundo, o James
Almeida, Elizabeth Barcelos, Kristine Nunes, Stephanie Lam, José Martinez, Gerson Moraes e
Lilia Braga.
No final da sessão foi lançado um repto final: completar este dossiê com os vários momentos
da aula, tão bem planeados e executados pelos alunos, e acrescentar a participação dos
estudantes de Berkeley que irão estudar este mesmo tema tratado nesta sessão, de forma a
constituir uma versão final, mais completa e talvez, uma possível edição. Os estudantes
estarão a partir de agora comunicáveis pelo site summer program in Portugal mas, sem
dúvida, que este encontro presencial deixará marcas para o futuro. Um futuro que seja de
maior intervenção e de mudança como sugere o poema de Jorge Palma. E que esse Portugal
seja também brilhante e promissor, com as crianças - o seu futuro…
O encontro terminou ao som da “ Vareira” de Fausto Neves interpretado pela Orquestra
Clássica de Espinho - coro Amigos da Academia, sendo os trabalhos gravados pelos alunos do
curso de multimédia, a cargo do Professor Manuel Novais da Escola Secundária Dr Manuel
Laranjeira.
O grupo almoçou junto, professores e alunos, desfrutando de um ambiente afável e
acolhedor na Cantina da Escola Secundária Dr Manuel Gomes de Almeida . Mais tarde, seguiu-
se a visita guiada pela cidade, à descoberta das belezas de Espinho, das emblemáticas
fachadas das casas onde os azulejos marcam presença, até ao revolto mar onde a espuma
enrola na areia da praia , até à estação de comboio, chegado o momento da partida.
Deolinda Adão partiu com os seus estudantes, de comboio, certamente que levaram alguns
momentos inesquecíveis dos trabalhos apresentados e memórias da cidade de Espinho, e ,
segundo nos confessaram, ficaram com vontade de voltar. Não é e este o melhor
reconhecimento para a os anfitriões, neste caso, a Associação Mulher Migrante, as Escolas
Secundárias e a cidade de Espinho?
Viveram-se momentos de divulgação da cultura e da língua portuguesa, de excelente convívio
entre professores e jovens luso descendentes a viver nos Estados Unidos e Jovens de Espinho
e, por fim, a celebração simbólica dos 800 anos da existência oficial da língua portuguesa,
falada em todos os continentes, graças aos portugueses da diáspora.
Arcelina Santiago
9 de julho de 2014
Na biblioteca Municipal José Marmelo e Silva, os estudantes, orientados pela Drª Carminda
Costa e Dr. João Paulo Reis, professores da Escola Secundária, Dr Manuel Gomes de Almeida
e Dr Manuel Gomes de Almeida, respetivamente, aguardavam os alunos luso descendentes,
acompanhados pela Professora de Literatura e Língua Portuguesa da Universidade de S. José e
Berkeley, Deolinda Adão.
Atravessaram o oceano para chegar a terras do Luso para estudarem in loco as tradições , a
cultura e a língua que tanto desejam estudar. Os estudantes de Espinho aguardavam ansiosos
o momento, não escondendo a responsabilidade de serem os anfitriões e animadores de uma
sessão que tinham preparado cuidadosamente, sobre literatura e língua portuguesa.
Leonor Fonseca, vereadora da Câmara Municipal, também esteve presente e deu as boas-
vindas ao grupo de jovens das duas Escolas Secundárias de Espinho e aos jovens universitários
americanos e à sua Professora, Deolinda Adão. Agradeceu à Associação de Estudo,
Cooperação e Solidariedade – Mulher Migrante, promotora desta iniciativa de ligação de
jovens dos dois continentes, por ter inserido Espinho no roteiro da sua visita a Portugal,
durante as oito semanas dedicadas ao estudo da cultura e da língua portuguesa. Destacou a
importância simbólica deste encontro, no ano da celebração dos 800 anos da existência da
língua portuguesa e elogiou o empenho que as escolas deste concelho têm, merecedoras de
grande admiração.
O início dos trabalhos do workshop organizado pelos alunos, desenrolou-se durante as horas
seguintes. A sessão foi embalada com música de fundo com o tema “ Canção do mar “
interpretado por Dulce Pontes, esse mar simbolicamente representado por um extenso pano
azul a unir as 5 mesas dos grupos de trabalho, representando, desta forma, os 5 continentes
que o mar une, mais do que separa.
Os alunos Miriam Rendeiro, Ana Carolina Reis, Carolina Marques, Filipe Lopes, Gonçalo
Sabença, Andreia Ferreira, Beatriz Santos, Emeline Amorim, Maria João Cruz e Alexandra
Romão foram apoiados pelos seus professores Carminda Costa e João Paulo Reis, na seleção
dos textos. Os professores orgulhosos do trabalho dos seus alunos revelaram que o grupo se
organizou de forma autónoma e criativa, programando a magnífica apresentação sobre a
língua e cultura portuguesa. A escolha de textos da “Mensagem” de Fernando Pessoa,
representativos da divisão do poema - nascer, crescer, morrer e ressuscitar, o poema de
Jorge de Palma, “ Portugal, Portugal” e “ O Portugal Futuro” de Ruy Belo, foram lidos,
contextualizados, interpretados, seguindo-se propostas de trabalho, desde jogos de palavras
para completar poemas, com apoio a ilustrações, propostas de dramatização que os jovens
americanos acolheram de forma muito entusiasta.
Estivemos perante uma sessão de ensino/aprendizagem muito peculiar, tratou-se de uma
aula viva e criativa, momentos de homenagem à nossa língua em data de celebração dos cem
anos. Toda a sessão foi acompanhada pela ilustração, ao vivo, por alunos de artes, Joana
Bastos e Guilherme Peres. Também eles foram autores, juntamente com Miriam Rendeiro,
orientados pela Professora de Artes, da Escola Secundária Dr. Manuel Gomes de Almeida,
Aurora Bernardo, das magnificas ilustrações alusivas aos poemas apresentados que foram
compilados em forma de dossiê e ofertados aos jovens outro lado do mundo, o James
Almeida, Elizabeth Barcelos, Kristine Nunes, Stephanie Lam, José Martinez, Gerson Moraes e
Lilia Braga.
No final da sessão foi lançado um repto final: completar este dossiê com os vários momentos
da aula, tão bem planeados e executados pelos alunos, e acrescentar a participação dos
estudantes de Berkeley que irão estudar este mesmo tema tratado nesta sessão, de forma a
constituir uma versão final, mais completa e talvez, uma possível edição. Os estudantes
estarão a partir de agora comunicáveis pelo site summer program in Portugal mas, sem
dúvida, que este encontro presencial deixará marcas para o futuro. Um futuro que seja de
maior intervenção e de mudança como sugere o poema de Jorge Palma. E que esse Portugal
seja também brilhante e promissor, com as crianças - o seu futuro…
O encontro terminou ao som da “ Vareira” de Fausto Neves interpretado pela Orquestra
Clássica de Espinho - coro Amigos da Academia, sendo os trabalhos gravados pelos alunos do
curso de multimédia, a cargo do Professor Manuel Novais da Escola Secundária Dr Manuel
Laranjeira.
O grupo almoçou junto, professores e alunos, desfrutando de um ambiente afável e
acolhedor na Cantina da Escola Secundária Dr Manuel Gomes de Almeida . Mais tarde, seguiu-
se a visita guiada pela cidade, à descoberta das belezas de Espinho, das emblemáticas
fachadas das casas onde os azulejos marcam presença, até ao revolto mar onde a espuma
enrola na areia da praia , até à estação de comboio, chegado o momento da partida.
Deolinda Adão partiu com os seus estudantes, de comboio, certamente que levaram alguns
momentos inesquecíveis dos trabalhos apresentados e memórias da cidade de Espinho, e ,
segundo nos confessaram, ficaram com vontade de voltar. Não é e este o melhor
reconhecimento para a os anfitriões, neste caso, a Associação Mulher Migrante, as Escolas
Secundárias e a cidade de Espinho?
Viveram-se momentos de divulgação da cultura e da língua portuguesa, de excelente convívio
entre professores e jovens luso descendentes a viver nos Estados Unidos e Jovens de Espinho
e, por fim, a celebração simbólica dos 800 anos da existência oficial da língua portuguesa,
falada em todos os continentes, graças aos portugueses da diáspora.
Arcelina Santiago
quinta-feira, 11 de dezembro de 2014
UNIV ABERTA Prof Ana Paula Beja Horta
Nota de Abertura - Mesa Redonda Mulheres Migrantes e Cidadania.
Antes e Depois de Abril, Universidade Aberta, Salão Nobre, 5 de junho de
2014
Ana Paula Beja Horta – Doutorada em Sociologia. Professora da Universidade Aberta,
Investigadora do Centro de Estudos das Migrações e das Relações Interculturais
(CEMRI), ana.horta@uab.pt
Neste ano de comemorações do vigésimo aniversário da Associação de Estudo
Cooperação e Solidariedade – Mulher Migrante (AEMM), da qual tenho honra de ser
um dos membros fundadores, as minhas maiores felicitações à Dra. Maria Manuela
Aguiar (Presidente da Assembleia Geral da AEMM) à Dra. Rita Gomes (Presidente da
Direção da AEMM) e aos seus Corpos Sociais pelo percurso notável e o contributo
indelével da Associação em prol da igualdade de direitos e da participação cidadã das
mulheres migrantes e em particular das mulheres portuguesas na Diáspora. Gostaria,
igualmente, de manifestar os meus agradecimentos pelo convite para participar na co-
organização desta iniciativa subordinada ao tema Mulheres Migrantes e Cidadania.
Antes e Depois de Abril, que bem traduz o já longo e estreito percurso de parceria
científica e cívica entre a AEMM e o Centro de Estudos das Migrações e das Relações
Interculturais, Universidade Aberta.
Importa, igualmente, referir a relevância do tema deste evento que ganha especial
significado e simbolismo no contexto das celebrações do 40º aniversário do 25 de Abril,
constituindo um importante contributo para o diálogo e reflexão sobre a evolução da
situação das mulheres migrantes num quadro temporal e espacial alargado. De facto, os
temas das intervenções dos participantes nesta Mesa Redonda remetem-nos para uma
discussão renovada sobre mulheres migrantes e a instituição cidadania, ao longo dos
tempos, configurada por diferentes percursos migratórios e pelos múltiplos contextos
socio, económicos e políticos das migrações portuguesas.
A relação entre migrações, género, cidadania tem sido um eixo central de intervenção
continuada das atividades da AEMM, desde a sua fundação. Para tal, basta revisitar,
entre muitos outros eventos, a importante iniciativa transnacional, Encontros para a
Cidadania, promovida pela AEMM entre 2005 e 2009 e realizada nos quatro cantos do
mundo onde residem comunidades portuguesas. A participação de centenas de
participantes nestes Encontros, incluindo as associações migrantes, instituições oficiais,
organizações da sociedade civil e mulheres e homens migrantes é bem reveladora da
importância das questões do Género e da Cidadania nos contextos migratórios
portugueses da atualidade.
Ao longo de 20 anos de atividade, a problemática das Mulheres Migrantes e da
Cidadania norteou as diferentes fases de desenvolvimento da Associação quer a nível
dos seus objetivos quer a nível da sua estratégia de intervenção, tendo ganho especial
protagonismo na última década. Os Encontros para a Cidadania são um exemplo
paradigmático de um projeto inédito de intervenção e de mobilização das comunidades
portuguesas em torno da defesa da igualdade de direitos e da promoção da participação
cívica das mulheres migrantes no contexto do país de acolhimento e no país de origem.
Referido como um “paradigma de mobilização para a igualdade entre mulheres e
homens” (Aguiar, 2014b), este projeto permite repensar o fenómeno migratório
português, trazendo para o centro do debate a posição das mulheres emigrantes nas
múltiplas vertentes do exercício da cidadania. A análise aprofundada deste novo
“paradigma” de intervenção transcende, obviamente, o âmbito desta breve apresentação.
Contudo, importa referir duas dimensões que se apresentam de particular acuidade para
o tema desta Mesa Redonda. A primeira reporta-se à dimensão da participação política
das mulheres, no quadro da emigração portuguesa e a segunda à participação cívica, ou
seja ao associativismo feminino.
Como é bem conhecido, o papel das mulheres nos processos migratórios foi, durante
décadas, ignorado ou secundarizado tanto no quadro político como na esfera social,
académica e científica. A noção dominante de que “o homem migra e a mulher segue-o”
viria a traduzir-se na exclusão sistemática das questões de género das políticas
migratórias internacionais e nacionais. É, sobretudo, a partir da década de noventa do
século passado que se assiste a uma inversão desta tendência de “invisibilidade” das
mulheres no espaço público do debate político, bem como nas agendas de investigação
(Boyd, M. e E. Grieconas, 2003; Relatório CSEM, 2014). Mais recentemente, a
integração do género nas políticas migratórias, bem como a implementação de políticas
de igualdade de direitos têm vindo a ganhar um protagonismo sem precedentes a nível
internacional.1
No contexto nacional, é após o 25 de Abril que passamos a assistir à implementação de
medidas políticas de valorização do papel das mulheres migrantes que visam potenciar o
acesso à cidadania plena. Neste âmbito, é indiscutível o contributo da AEMM para a
criação de novos espaços públicos de debate e de reivindicação, sendo, presentemente, a
inclusão da componente de género nas políticas migratórias e em estruturas de
representação das comunidades portuguesas (Conselho das Comunidades Portuguesas)
tem sido uma questão que tem merecido especial atenção (Aguiar, 2008;2014b). Por
outro lado, o continuado diálogo com as instâncias políticas, instituições oficiais e com
outras organizações da sociedade civil nacionais e internacionais contribuiu para o
desenvolvimento de um ativismo cívico transnacional capaz de mobilizar uma
multiplicidade de agentes políticos, institucionais e sociais em Portugal e no seio das
comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo. As dinâmicas transnacionais de
intervenção cívica da AEMM têm permitido, igualmente, criar um quadro abrangente de
1 A este respeito ver, por exemplo, Guide on Gender-Sensitive Migration Policies, 2009. Organization for
Security and Co-operation in Europe (OSCE). Disponível em: http://www.osce.org/node/37228
mobilização das mulheres emigrantes para a participação política em Portugal e no país
de destino. De facto, a conjugação desta dupla vertente de politização e de valorização
de uma prática cidadã transnacional reveste-se da maior importância, num mundo
globalizado tecido por uma multiplicidade de pertenças, de vivências, de interações e de
projetos de cidadania que se intersectam e se complementam.
Estas considerações remetem-nos, necessariamente, para a segunda dimensão, acima
referida e que se reporta ao associativismo migrante. A densa e multifacetada rede do
tecido associativo das comunidades portuguesas tem desempenhado um papel
fundamental na atualização dos laços de pertença e identitários com o país de origem,
bem como nos processos de adaptação e de integração das comunidades portuguesas
nos países de destino (Rocha-Trindade, 2010). As dinâmicas do associativismo
emigrante têm sido uma área prioritária de intervenção da AEMM, sobretudo no que
respeita à participação das mulheres migrantes no movimento associativo. O
reconhecimento da subalternidade das mulheres nas associações e a necessidade de
implementação de novas práticas de participação têm constituído um dos eixos
prioritários da atuação da AEMM. A permanente e intensa interação com líderes
associativos, os inúmeros eventos realizados em colaboração com as organizações das
comunidades portuguesas evidenciam bem o compromisso da AEMM nesta esfera de
participação cívica. A este respeito as palavras de Manuela Aguiar são bem elucidativas
de uma visão abrangente de cidadania que passa necessariamente por uma maior
visibilidade e participação das mulheres migrantes no movimento associativo “A
AEMM, consciente desta evolução assimétrica, na generalidade dos países, tem
concentrado os seus esforços na mobilização das mulheres para uma participação de
vanguarda nas comunidades portuguesas, a fim de que se convertam em espaço de
expressão da cidadania e se expandam com a inclusão de grupos marginalizados,
invertendo a tendência para o seu declínio, tantos profetizam e justamente receiam.”
(Aguiar, 2014a:49).
Em nota final, estamos perante uma perspetiva de cidadania alargada e de mobilização
de novas práticas de inclusão e de emancipação das mulheres migrantes nos múltiplos
espaços de intervenção política e cívica. Eis o grande desafio que a Associação de
Estudo Cooperação e Solidariedade – Mulher Migrante coloca a todos e a todas nós
aqui presentes e na Diáspora. Como alude a Dra. Rita Gomes (2014) o trabalho da
AEMM continua a ser um caminho aberto aos muitos mundos das migrações, no qual
de uma forma outra ou de outra somos parte integrante e comprometida.
Referências Bibliográficas
Aguiar, Manuela (2014a), “Um dia na História da AEMM” in Aguiar, M, M., Guedes e
Santiago, A., (Orgs.), Entre Portugueses. Associação Mulher Migrante,
Espinho:Cooperativa Gráfica de Espinho, pp. 49.
Aguiar, Manuela (2014b), “As questões do género nas políticas de emigração
portuguesa” in Miranda, J e Horta, A.P.B. Migrações e Género. Espaços, Poderes e
Identidades, Lisboa: Editor Mundos Sociais.
Aguiar, Manuela (2008), "Mulheres Migrantes e Intervenção Cívica" in Simas, M.R.
(org), "A Mulher e o Trabalho nos Açores e nas Comunidades", Ponta Delgada: UMAR
Açores.
Boyd, M. e E. Grieco (2003), Women and Migration: Incorporating Gender into
International Migration Theory. Migration Policy Institute: Migration Information
Source. Washington, D.C. March.
Gomes, Rita (2014), “20 Anos da Associação”, in Aguiar, M., Guedes, G e Santiago,
A., (Orgs.), Entre Portugueses. Associação Mulher Migrante, Cooperativa Gráfica de
Espinho.
Guide on Gender-Sensitive Migration Policies, 2009. Organization for Security and Co-
operation in Europe (OSCE). Disponível em: http://www.osce.org/node/37228
Relatório – Mulher Migrante. Agente de Resistência e Transformação (2014), Brasília:
CSEM.
Rocha-Trindade, M.B. (2010) “Associativismo em Contexto Migratório” Revista
Migrações, Nº 6, Número Especial – Associativismo Imigrante, Horta, A.P.B. (Org.),
ACIDI, OI.
.
Antes e Depois de Abril, Universidade Aberta, Salão Nobre, 5 de junho de
2014
Ana Paula Beja Horta – Doutorada em Sociologia. Professora da Universidade Aberta,
Investigadora do Centro de Estudos das Migrações e das Relações Interculturais
(CEMRI), ana.horta@uab.pt
Neste ano de comemorações do vigésimo aniversário da Associação de Estudo
Cooperação e Solidariedade – Mulher Migrante (AEMM), da qual tenho honra de ser
um dos membros fundadores, as minhas maiores felicitações à Dra. Maria Manuela
Aguiar (Presidente da Assembleia Geral da AEMM) à Dra. Rita Gomes (Presidente da
Direção da AEMM) e aos seus Corpos Sociais pelo percurso notável e o contributo
indelével da Associação em prol da igualdade de direitos e da participação cidadã das
mulheres migrantes e em particular das mulheres portuguesas na Diáspora. Gostaria,
igualmente, de manifestar os meus agradecimentos pelo convite para participar na co-
organização desta iniciativa subordinada ao tema Mulheres Migrantes e Cidadania.
Antes e Depois de Abril, que bem traduz o já longo e estreito percurso de parceria
científica e cívica entre a AEMM e o Centro de Estudos das Migrações e das Relações
Interculturais, Universidade Aberta.
Importa, igualmente, referir a relevância do tema deste evento que ganha especial
significado e simbolismo no contexto das celebrações do 40º aniversário do 25 de Abril,
constituindo um importante contributo para o diálogo e reflexão sobre a evolução da
situação das mulheres migrantes num quadro temporal e espacial alargado. De facto, os
temas das intervenções dos participantes nesta Mesa Redonda remetem-nos para uma
discussão renovada sobre mulheres migrantes e a instituição cidadania, ao longo dos
tempos, configurada por diferentes percursos migratórios e pelos múltiplos contextos
socio, económicos e políticos das migrações portuguesas.
A relação entre migrações, género, cidadania tem sido um eixo central de intervenção
continuada das atividades da AEMM, desde a sua fundação. Para tal, basta revisitar,
entre muitos outros eventos, a importante iniciativa transnacional, Encontros para a
Cidadania, promovida pela AEMM entre 2005 e 2009 e realizada nos quatro cantos do
mundo onde residem comunidades portuguesas. A participação de centenas de
participantes nestes Encontros, incluindo as associações migrantes, instituições oficiais,
organizações da sociedade civil e mulheres e homens migrantes é bem reveladora da
importância das questões do Género e da Cidadania nos contextos migratórios
portugueses da atualidade.
Ao longo de 20 anos de atividade, a problemática das Mulheres Migrantes e da
Cidadania norteou as diferentes fases de desenvolvimento da Associação quer a nível
dos seus objetivos quer a nível da sua estratégia de intervenção, tendo ganho especial
protagonismo na última década. Os Encontros para a Cidadania são um exemplo
paradigmático de um projeto inédito de intervenção e de mobilização das comunidades
portuguesas em torno da defesa da igualdade de direitos e da promoção da participação
cívica das mulheres migrantes no contexto do país de acolhimento e no país de origem.
Referido como um “paradigma de mobilização para a igualdade entre mulheres e
homens” (Aguiar, 2014b), este projeto permite repensar o fenómeno migratório
português, trazendo para o centro do debate a posição das mulheres emigrantes nas
múltiplas vertentes do exercício da cidadania. A análise aprofundada deste novo
“paradigma” de intervenção transcende, obviamente, o âmbito desta breve apresentação.
Contudo, importa referir duas dimensões que se apresentam de particular acuidade para
o tema desta Mesa Redonda. A primeira reporta-se à dimensão da participação política
das mulheres, no quadro da emigração portuguesa e a segunda à participação cívica, ou
seja ao associativismo feminino.
Como é bem conhecido, o papel das mulheres nos processos migratórios foi, durante
décadas, ignorado ou secundarizado tanto no quadro político como na esfera social,
académica e científica. A noção dominante de que “o homem migra e a mulher segue-o”
viria a traduzir-se na exclusão sistemática das questões de género das políticas
migratórias internacionais e nacionais. É, sobretudo, a partir da década de noventa do
século passado que se assiste a uma inversão desta tendência de “invisibilidade” das
mulheres no espaço público do debate político, bem como nas agendas de investigação
(Boyd, M. e E. Grieconas, 2003; Relatório CSEM, 2014). Mais recentemente, a
integração do género nas políticas migratórias, bem como a implementação de políticas
de igualdade de direitos têm vindo a ganhar um protagonismo sem precedentes a nível
internacional.1
No contexto nacional, é após o 25 de Abril que passamos a assistir à implementação de
medidas políticas de valorização do papel das mulheres migrantes que visam potenciar o
acesso à cidadania plena. Neste âmbito, é indiscutível o contributo da AEMM para a
criação de novos espaços públicos de debate e de reivindicação, sendo, presentemente, a
inclusão da componente de género nas políticas migratórias e em estruturas de
representação das comunidades portuguesas (Conselho das Comunidades Portuguesas)
tem sido uma questão que tem merecido especial atenção (Aguiar, 2008;2014b). Por
outro lado, o continuado diálogo com as instâncias políticas, instituições oficiais e com
outras organizações da sociedade civil nacionais e internacionais contribuiu para o
desenvolvimento de um ativismo cívico transnacional capaz de mobilizar uma
multiplicidade de agentes políticos, institucionais e sociais em Portugal e no seio das
comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo. As dinâmicas transnacionais de
intervenção cívica da AEMM têm permitido, igualmente, criar um quadro abrangente de
1 A este respeito ver, por exemplo, Guide on Gender-Sensitive Migration Policies, 2009. Organization for
Security and Co-operation in Europe (OSCE). Disponível em: http://www.osce.org/node/37228
mobilização das mulheres emigrantes para a participação política em Portugal e no país
de destino. De facto, a conjugação desta dupla vertente de politização e de valorização
de uma prática cidadã transnacional reveste-se da maior importância, num mundo
globalizado tecido por uma multiplicidade de pertenças, de vivências, de interações e de
projetos de cidadania que se intersectam e se complementam.
Estas considerações remetem-nos, necessariamente, para a segunda dimensão, acima
referida e que se reporta ao associativismo migrante. A densa e multifacetada rede do
tecido associativo das comunidades portuguesas tem desempenhado um papel
fundamental na atualização dos laços de pertença e identitários com o país de origem,
bem como nos processos de adaptação e de integração das comunidades portuguesas
nos países de destino (Rocha-Trindade, 2010). As dinâmicas do associativismo
emigrante têm sido uma área prioritária de intervenção da AEMM, sobretudo no que
respeita à participação das mulheres migrantes no movimento associativo. O
reconhecimento da subalternidade das mulheres nas associações e a necessidade de
implementação de novas práticas de participação têm constituído um dos eixos
prioritários da atuação da AEMM. A permanente e intensa interação com líderes
associativos, os inúmeros eventos realizados em colaboração com as organizações das
comunidades portuguesas evidenciam bem o compromisso da AEMM nesta esfera de
participação cívica. A este respeito as palavras de Manuela Aguiar são bem elucidativas
de uma visão abrangente de cidadania que passa necessariamente por uma maior
visibilidade e participação das mulheres migrantes no movimento associativo “A
AEMM, consciente desta evolução assimétrica, na generalidade dos países, tem
concentrado os seus esforços na mobilização das mulheres para uma participação de
vanguarda nas comunidades portuguesas, a fim de que se convertam em espaço de
expressão da cidadania e se expandam com a inclusão de grupos marginalizados,
invertendo a tendência para o seu declínio, tantos profetizam e justamente receiam.”
(Aguiar, 2014a:49).
Em nota final, estamos perante uma perspetiva de cidadania alargada e de mobilização
de novas práticas de inclusão e de emancipação das mulheres migrantes nos múltiplos
espaços de intervenção política e cívica. Eis o grande desafio que a Associação de
Estudo Cooperação e Solidariedade – Mulher Migrante coloca a todos e a todas nós
aqui presentes e na Diáspora. Como alude a Dra. Rita Gomes (2014) o trabalho da
AEMM continua a ser um caminho aberto aos muitos mundos das migrações, no qual
de uma forma outra ou de outra somos parte integrante e comprometida.
Referências Bibliográficas
Aguiar, Manuela (2014a), “Um dia na História da AEMM” in Aguiar, M, M., Guedes e
Santiago, A., (Orgs.), Entre Portugueses. Associação Mulher Migrante,
Espinho:Cooperativa Gráfica de Espinho, pp. 49.
Aguiar, Manuela (2014b), “As questões do género nas políticas de emigração
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Migrações, Nº 6, Número Especial – Associativismo Imigrante, Horta, A.P.B. (Org.),
ACIDI, OI.
.
MM Aguiar em Toronto
Nesta esplêndida sala da Universidade de Toronto, que nos é
aberta pela Professora Manuela Marujo, começo por partilhar com todos os amigos
que reencontro e que saúdo, uma preocupação: como sintetizar os principais acontecimentos dos últimos 40 anos de
migrações
portuguesas, em 15 minutos? … O tempo vou cumprir, com certeza, porque não há melhor e mais rigorosa organizadora do que a nossa ilustre anfitriã. Quanto ao desafio que me lança, vou tentar…
Inspirando-me no título que Manuela Marujo escolheu para este colóquio, direi: que foram 40 anos de vivência da democracia partilhados na comunidade nacional, no território e na diáspora. A liberdade de emigrar, os direitos de cidadania, de participação na vida política, social e cultural do País, a dupla cidadania, foram reconhecidos, pela primeira vez, aos emigrantes. Com eles se fez e se faz a democracia num espaço alargado, de reencontro da Nação e do Estado. Eis o grande “acquis” da Revolução, ou, como se dizia, em 1974, a grande “conquista de Abril”
Todavia, a história dos movimentos migratórios - e das situações
vividas pelas pessoas e pelas comunidades - no período considerado,
foi marcada (mais do que em qualquer outro…) por contradições, rupturas, imprevistos, determinados, frequentemente, por causas exógenas e incontroláveis, que testaram a nossa capacidade de reacção
Distinguirei, nesta reflexão sobre o curso das nossas migrações recentes - e sobre as políticas que suscitaram - três fases muito distintas.
1 - Uma primeira fase se inicia em 1973/74, com a recessão económica generalizada, o fim da ditadura em Portugal e a descolonização do último império europeu. A revolução veio garantir um estatuto cidadania, e políticas de protecção dos emigrantes no estrangeiro e no regresso a casa.
Todavia, as nossas fronteiras abrem-se, precisamente quando se encerram, devido ao “choque petrolífero” e a uma crise mundial, as dos países que haviam recebido, nas duas décadas precedentes, cerca de dois milhões de portugueses (a França e outros vizinhos europeus à cabeça, sem esquecer (como são, tantas vezes, esquecidos), os chamados “novos destinos transoceânicos”, o Canadá, a Venezuela, a Austrália…).
A descolonização provoca, de imediato, o súbito e caótico retorno de África cerca de 800.00 a um milhão, entre 1974/76, num tempo em que irrompia já, gradualmente, o regresso voluntário, ordenado, programado -e, por isso praticamente invisível – dos expatriados da Europa, que se intensificaria ao longo dos anos 80, atingindo um total que se estima em mais de 800.000.
A nossa própria situação económica, agravada pela turbulência social e política, deveria ter tornado impossível o bom sucesso destes dois diversos surtos de regresso. Mas não…pelo contrário, foram parte da democratização do País, contribuíram, fortemente, para a sua
estabilização, tornaram vantajoso um desmesurado vaivém de quase dois milhões de pessoas. Pode perguntar-se: como? porquê? A meu ver, pelo especial perfil dos que chegavam, por muito mérito seu, acompanhado pelo inesperado acerto das políticas, num domínio onde sempre imperara a inércia do Estado.
De África vinham portugueses desenvoltos, mais qualificados profissionalmente, muitos com experiência empresarial, da Europa migrantes com reformas, rendimentos, pequenos projectos viáveis de investimento - "uma geração de triunfadores" na feliz expressão de Eduardo Lourenço.
Uns e outros, não ficaram só nas grandes cidades, repovoaram regiões desertificadas pelo ciclo transmigratório anterior. Uns e outros aproveitaram da melhor maneira os incentivos oferecidos pelos Governos – as contas de poupança crédito, os empréstimos a juro bonificado para emigrantes, os fundos de apoio ao investimento para os retornados de África.
O temor com que a opinião pública, os media e, também, alguns políticos, sempre olharam a dimensão avassaladora do retorno não se justificou…
2 – As políticas de Emigração e Diáspora
portuguesas, em 15 minutos? … O tempo vou cumprir, com certeza, porque não há melhor e mais rigorosa organizadora do que a nossa ilustre anfitriã. Quanto ao desafio que me lança, vou tentar…
Inspirando-me no título que Manuela Marujo escolheu para este colóquio, direi: que foram 40 anos de vivência da democracia partilhados na comunidade nacional, no território e na diáspora. A liberdade de emigrar, os direitos de cidadania, de participação na vida política, social e cultural do País, a dupla cidadania, foram reconhecidos, pela primeira vez, aos emigrantes. Com eles se fez e se faz a democracia num espaço alargado, de reencontro da Nação e do Estado. Eis o grande “acquis” da Revolução, ou, como se dizia, em 1974, a grande “conquista de Abril”
Todavia, a história dos movimentos migratórios - e das situações
vividas pelas pessoas e pelas comunidades - no período considerado,
foi marcada (mais do que em qualquer outro…) por contradições, rupturas, imprevistos, determinados, frequentemente, por causas exógenas e incontroláveis, que testaram a nossa capacidade de reacção
Distinguirei, nesta reflexão sobre o curso das nossas migrações recentes - e sobre as políticas que suscitaram - três fases muito distintas.
1 - Uma primeira fase se inicia em 1973/74, com a recessão económica generalizada, o fim da ditadura em Portugal e a descolonização do último império europeu. A revolução veio garantir um estatuto cidadania, e políticas de protecção dos emigrantes no estrangeiro e no regresso a casa.
Todavia, as nossas fronteiras abrem-se, precisamente quando se encerram, devido ao “choque petrolífero” e a uma crise mundial, as dos países que haviam recebido, nas duas décadas precedentes, cerca de dois milhões de portugueses (a França e outros vizinhos europeus à cabeça, sem esquecer (como são, tantas vezes, esquecidos), os chamados “novos destinos transoceânicos”, o Canadá, a Venezuela, a Austrália…).
A descolonização provoca, de imediato, o súbito e caótico retorno de África cerca de 800.00 a um milhão, entre 1974/76, num tempo em que irrompia já, gradualmente, o regresso voluntário, ordenado, programado -e, por isso praticamente invisível – dos expatriados da Europa, que se intensificaria ao longo dos anos 80, atingindo um total que se estima em mais de 800.000.
A nossa própria situação económica, agravada pela turbulência social e política, deveria ter tornado impossível o bom sucesso destes dois diversos surtos de regresso. Mas não…pelo contrário, foram parte da democratização do País, contribuíram, fortemente, para a sua
estabilização, tornaram vantajoso um desmesurado vaivém de quase dois milhões de pessoas. Pode perguntar-se: como? porquê? A meu ver, pelo especial perfil dos que chegavam, por muito mérito seu, acompanhado pelo inesperado acerto das políticas, num domínio onde sempre imperara a inércia do Estado.
De África vinham portugueses desenvoltos, mais qualificados profissionalmente, muitos com experiência empresarial, da Europa migrantes com reformas, rendimentos, pequenos projectos viáveis de investimento - "uma geração de triunfadores" na feliz expressão de Eduardo Lourenço.
Uns e outros, não ficaram só nas grandes cidades, repovoaram regiões desertificadas pelo ciclo transmigratório anterior. Uns e outros aproveitaram da melhor maneira os incentivos oferecidos pelos Governos – as contas de poupança crédito, os empréstimos a juro bonificado para emigrantes, os fundos de apoio ao investimento para os retornados de África.
O temor com que a opinião pública, os media e, também, alguns políticos, sempre olharam a dimensão avassaladora do retorno não se justificou…
2 – As políticas de Emigração e Diáspora
Segue-se um ciclo, caracterizado pela ausência de grandes
vagas
migratórias – ao menos quando comparado com o
antecedente. As saídas –
exceptuadas as período do retorno das antigas colónias, para África do Sul,
Brasil e, em menor número, para muitos outros países, quase se limitam ao
reagrupamento familiar – fala-se em “feminização”
da emigração, acentua-se o equilíbrio dos sexos, a criação de comunidades orgânicas, com o progressivo
enraizamento do associativismo na
cultura popular, vivida por famílias inteiras.
As políticas de emigração
procuram formas de parceria com estes
movimentos, para os quais o Estado em nada contribuíra, com uma nova consciência da sua importância, quer na
afirmação colectiva da presença portuguesa, quer na defesa dos direitos individuais. O Conselho das Comunidades Portugueses é criado, junto da Secretaria de Estado da Emigração e Comunidades Portuguesas, como instrumento de diálogo, de representação das comunidades, e de co-participação nas políticas para as migrações e para a diáspora – com
a expressa intenção de abrir um novo capítulo nas políticas de emigração.
A Secretaria de Estado foi desenvolvendo toda uma arquitectura institucional, com um Instituto, dotado de autonomia administrativa e financeira. o IAECP, as delegações, dentro e fora de fronteiras, os núcleos de assistentes sociais, os conselheiros sociais. De salientar, em especial, o recrutamento e formação de técnicos especializados, de forma a apoiar tanto a opção do regresso, como a de integração no estrangeiro, sem corte das ligações ao país.
De início a emigração europeia absorvia, quase completamente, o centro das atenções. A partir de 80, com o CCP como plataforma de diálogo, vai-se alargando o enfoque dos outros continentes, às comunidades mais antigas, à diáspora. As políticas de género embrionárias datam de 1985, com a tentativa de compensar a ausência feminina no CCP – Málice Ribeiro, em representação dos “media” de Toronto foi uma das raras mulheres a distinguir-se nesse forum.
A adesão à CEE, em 1985, deu aos portugueses a liberdade de circulação no espaço comunitário, mas não grandes oportunidades de a aproveitar, em concreto…Os fluxos migratórios, que persistiram, dirigiram-se a novos mercados de trabalho, a Suiça, o Médio Oriente – em regra, através de projectos temporários, de curta duração.
afirmação colectiva da presença portuguesa, quer na defesa dos direitos individuais. O Conselho das Comunidades Portugueses é criado, junto da Secretaria de Estado da Emigração e Comunidades Portuguesas, como instrumento de diálogo, de representação das comunidades, e de co-participação nas políticas para as migrações e para a diáspora – com
a expressa intenção de abrir um novo capítulo nas políticas de emigração.
A Secretaria de Estado foi desenvolvendo toda uma arquitectura institucional, com um Instituto, dotado de autonomia administrativa e financeira. o IAECP, as delegações, dentro e fora de fronteiras, os núcleos de assistentes sociais, os conselheiros sociais. De salientar, em especial, o recrutamento e formação de técnicos especializados, de forma a apoiar tanto a opção do regresso, como a de integração no estrangeiro, sem corte das ligações ao país.
De início a emigração europeia absorvia, quase completamente, o centro das atenções. A partir de 80, com o CCP como plataforma de diálogo, vai-se alargando o enfoque dos outros continentes, às comunidades mais antigas, à diáspora. As políticas de género embrionárias datam de 1985, com a tentativa de compensar a ausência feminina no CCP – Málice Ribeiro, em representação dos “media” de Toronto foi uma das raras mulheres a distinguir-se nesse forum.
A adesão à CEE, em 1985, deu aos portugueses a liberdade de circulação no espaço comunitário, mas não grandes oportunidades de a aproveitar, em concreto…Os fluxos migratórios, que persistiram, dirigiram-se a novos mercados de trabalho, a Suiça, o Médio Oriente – em regra, através de projectos temporários, de curta duração.
Portugal queria
afirmar o seu sucesso, como parceiro igual
num “clube de ricos”, e proclamava, no discurso oficial, que deixara de ser um
país de emigração e se convertera
em país de imigração. Era uma
proclamação prematura, mas serviu de pretexto para o
desmantelamento dos serviços da emigração, que foram integrados na Direcção Geral dos Serviços Consulares, perdendo toda a sua autonomia. Pela mesma altura, na transição da década de 80 para 90, é desactivado o CCP, que ressurgiria em 1996 em novos moldes (com eleição por sufrágio directo e universal dos portugueses de passaporte, perdendo a sua componente de representação da diáspora)
Só em fins de século, com o lançamento de grandes obras públicas, se inicia, de facto o processo da imigração em massa, com preeminência de Europeus de leste e do Brasileiros
3 - Contra todas as expectativas, quando se realizara já a parte da profecia de um Portugal acolhedor de estrangeiros, em fins do século passado, eis que ressurge a emigração, no século XXI, desmentindo a outra metade do prognóstico, a de um Portugal onde acabara, para sempre, a necessidade premente de emigrar.
desmantelamento dos serviços da emigração, que foram integrados na Direcção Geral dos Serviços Consulares, perdendo toda a sua autonomia. Pela mesma altura, na transição da década de 80 para 90, é desactivado o CCP, que ressurgiria em 1996 em novos moldes (com eleição por sufrágio directo e universal dos portugueses de passaporte, perdendo a sua componente de representação da diáspora)
Só em fins de século, com o lançamento de grandes obras públicas, se inicia, de facto o processo da imigração em massa, com preeminência de Europeus de leste e do Brasileiros
3 - Contra todas as expectativas, quando se realizara já a parte da profecia de um Portugal acolhedor de estrangeiros, em fins do século passado, eis que ressurge a emigração, no século XXI, desmentindo a outra metade do prognóstico, a de um Portugal onde acabara, para sempre, a necessidade premente de emigrar.
É um êxodo que atinge proporções dramáticas, ameaçando
ultrapassar os números da década de 60. O Secretário de Estado José Cesário
enfrenta, sem sofismas, essa realidade e fala em mais de 120.000 partidas, ano
após ano.
Emigração temporária, de homens pouco qualificados, à maneira
tradicional, ainda constitui a maioria, mas é a chamada “nova emigração”, de profissionais
altamente qualificados, o fenómeno inédito de “brain drain”, que sobressai,
deixando os outras na sombra… De facto, partem todos os que podem partir,
fugindo da falta de horizontes de esperança – académicos, operários, jovens e menos
jovens, mulheres e homens. Um dos países mais envelhecidos do mundo, esvai-se
mais e mais, dispersa-se mais do que nunca, nos mais improváveis cantos da
Terra! É uma constatação assustadora….
De positivo, é de
realçar a escolha crescente do espaço lusófono, sobretudo pelos que têm formação
superior. Em Angola são já mais de 100.000, o Brasil está de volta neste
roteiro de destinos (pela primeira vez, coincidindo com grandes núcleos de brasileiros
espalhados por todo o Portugal). Moçambique e até Macau e Cabo Verde também (Cabo
Verde, que já foi a maior comunidade estrangeira a viver, entre nós, e que mantém
toda a importância).
Este intercâmbio dentro do “nosso mundo”, é facilitado por uma Europa em desagregação, que, perdido o cimento solidário e humanistas dos seus princípios fundadores, ameaça já a livre circulação dos cidadãos europeus - na dominante Alemanha, no Luxemburgo, no Reino Unido, por todo o lado…
Este intercâmbio dentro do “nosso mundo”, é facilitado por uma Europa em desagregação, que, perdido o cimento solidário e humanistas dos seus princípios fundadores, ameaça já a livre circulação dos cidadãos europeus - na dominante Alemanha, no Luxemburgo, no Reino Unido, por todo o lado…
É a hora de Portugal dar, estrategicamente, prioridade à
lusofonia, num desígnio de vivência em comum – a começar pelos povos, que é
sempre melhor do que principiar pelos Estados, como o demonstra a malogro do
projecto europeu…A aprofunda no enlace de migrações, nos dois sentidos
Portugal só tem futuro, se conseguir compensar a sua calamitosa
situação demográfica, com o apelo, mal o permita o crescimento económico, à vinda
em massa de jovens estrangeiros, e ao retorno - porventura muito mais incerto -
dos portugueses, mormente, dos
profissionais de elevado estatuto… Não defendendo o fechar de fronteiras à
demanda de outros estrangeiros, defendo, sim, uma activa política de convocação
dos povos lusófonos, que a nossa Constituição fundamenta, ao atribuir-lhes um
estatuto de direitos equiparável aos da nacionalidade (sob condição de
reciprocidade para os portugueses)
O nosso destino está, pois, dependente de um infindo vaivém de
vagas humanas, que as políticas devem saber acolher e projectar. Lá fora, a expansão
da língua e da cultura pela emigração e pela diáspora – com a diplomacia
cultural do MNE, da SECP, do Instituto Camões da RTPI, do CCP (na sua veste de
congregação do movimento associativo). No interior, o desenvolvimento e o equilíbrio
demográfico do país com políticas de hospitalidade e perfeita integração dos
imigrantes que hão-de vir
Maria Manuela Aguiar
terça-feira, 9 de dezembro de 2014
MEMÓRIA DO DIA DA MÃE
JOSÉ CAMACHO . Holanda (antigo Conselheiro do CCP)
Ir-lhes-ei descrever o que foi o "dia da Mãe" e a sua criadora, de seu nome Luísa Amália Cruz Camacho. Ela frequentou o Magistério Primário e, simultaneamente, a Academia de Belas Artes, tendo-se posteriormente licenciado em Psicologia.
Luísa Amália, minha mãe, muito nova, exerceu o magistério, tendo interrompido esta actividade quando escolheu Lisboa para residência. Mais tarde, foi admitida como administrativa nos Hospitais Civis de Lisboa.
A 3 de Maio, os meus pais criaram a "Cruzada da Orfandade Feminina de Lisboa", que ainda hoje existe, com outro nome. Humanidade e abnegação, algumas vezes de puro improviso... Escolheram a sua residência como sede da associação, que simultaneamente também servia de posto de vacinação contra a febre tifóide e a varíola
Luísa Amália, minha mãe, muito nova, exerceu o magistério, tendo interrompido esta actividade quando escolheu Lisboa para residência. Mais tarde, foi admitida como administrativa nos Hospitais Civis de Lisboa.
A 3 de Maio, os meus pais criaram a "Cruzada da Orfandade Feminina de Lisboa", que ainda hoje existe, com outro nome. Humanidade e abnegação, algumas vezes de puro improviso... Escolheram a sua residência como sede da associação, que simultaneamente também servia de posto de vacinação contra a febre tifóide e a varíola
Todos estes acontecimentos chegaram ao conhecimento do Ministro Afonso Ornelas, que concedeu um louvor a Luísa Amália e José Camacho..
Nos anos seguintes, desenvolveram diversas actividades de auxílio e informação sobre a pobreza generalizada de muitas famílias com filhos órfãos.
As actividades desta Cruzada foram notícia no jornal "O Século" em 1927, quando dos festejos do quarto aniversário da Associação, realizado no Ateneu Comercial, onde foram distribuídos calçado, vestuário e dinheiro à família de algumas crianças órfãs, cujos pais tinham sido vitimados pela última revolução.
Os meus pais nunca tiveram na vida pretensão a títulos de grandeza ou qualquer recompensa pela sua abnegação - talvez por este motivo estes acontecimentos tenham caído no esquecimento colectivo.
Depois de alguns desentendimentos com a pessoa encarregada da tesouraria (da família de general Carmona) os meus pais abandonaram a direcção da Cruzada, com muita mágoa.
Passados anos, Luísa Amália concorreu para o magistério primário. Deu aulas em diversas localidades, sendo a penúltima a aldeia de Silveirinha Grande (Pombal), no ano de 1935.
A professora Luísa Amália muito cedo constatou a pobreza existente naquela zona agravada pela guerra civil de Espanha. No ano de 1937, um grupo de mães de alunos juntaram-se à `ideia da "Senhora" - era assim que a tratavam - fizeram uma inventariação dos familiares mais necessitados, preparando em princípio a "semana da Mãe", para as famílias mais numerosas e necessitadas.
As ajudas que foram dadas no primeiro dia da Mãe consistiam em produtos hortícolas cultivados pelos alunos e alguns pais, e também pessoas de bem e algumas firmas contribuíram com verbas para as ajudas que tinham sido determinadas pelo grupo de trabalho.
Por este motivo, o Ministro da Educação Carneiro Pacheco, ao ter conhecimento desta efeméride, concedeu um louvor de agradecimento a Luísa Camacho, e, em 1948, o Presidente da República General Carmona
impôs-lhe a comenda da "Ordem de Cavaleiro da Instrução Pública"
Por tudo o supracitado, sinto-me na obrigação de dar a conhecer estas realidades..
Nos anos seguintes, desenvolveram diversas actividades de auxílio e informação sobre a pobreza generalizada de muitas famílias com filhos órfãos.
As actividades desta Cruzada foram notícia no jornal "O Século" em 1927, quando dos festejos do quarto aniversário da Associação, realizado no Ateneu Comercial, onde foram distribuídos calçado, vestuário e dinheiro à família de algumas crianças órfãs, cujos pais tinham sido vitimados pela última revolução.
Os meus pais nunca tiveram na vida pretensão a títulos de grandeza ou qualquer recompensa pela sua abnegação - talvez por este motivo estes acontecimentos tenham caído no esquecimento colectivo.
Depois de alguns desentendimentos com a pessoa encarregada da tesouraria (da família de general Carmona) os meus pais abandonaram a direcção da Cruzada, com muita mágoa.
Passados anos, Luísa Amália concorreu para o magistério primário. Deu aulas em diversas localidades, sendo a penúltima a aldeia de Silveirinha Grande (Pombal), no ano de 1935.
A professora Luísa Amália muito cedo constatou a pobreza existente naquela zona agravada pela guerra civil de Espanha. No ano de 1937, um grupo de mães de alunos juntaram-se à `ideia da "Senhora" - era assim que a tratavam - fizeram uma inventariação dos familiares mais necessitados, preparando em princípio a "semana da Mãe", para as famílias mais numerosas e necessitadas.
As ajudas que foram dadas no primeiro dia da Mãe consistiam em produtos hortícolas cultivados pelos alunos e alguns pais, e também pessoas de bem e algumas firmas contribuíram com verbas para as ajudas que tinham sido determinadas pelo grupo de trabalho.
Por este motivo, o Ministro da Educação Carneiro Pacheco, ao ter conhecimento desta efeméride, concedeu um louvor de agradecimento a Luísa Camacho, e, em 1948, o Presidente da República General Carmona
impôs-lhe a comenda da "Ordem de Cavaleiro da Instrução Pública"
Por tudo o supracitado, sinto-me na obrigação de dar a conhecer estas realidades..
Ao ter atingido os 85 anos, faço votos para, no pouco que me resta, ver reconhecida a memória do "dia da mãe", que hoje é festejado em todo o mundo, podendo ser numa data fixa, o ´ultimo domingo de cada mês de Maio, como aconteceu na escola da Silveirinha Grande no ano de 1937MAMÓRIA . Sem consumismo, mas com a invocação dos principais valores fundamentais de amor e estima para todas as mulheres de Portugal e do Mundo
TORONTO As malhas que o império tece
O Canadá recebe imigrantes de todos os países do mundo. Anualmente, uma quota de uma média de 250,000 novos residentes dão entrada neste país rico e democrático. Para quem se dedica a estudos de multiculturalismo, o Canadá tem sido um país modelo desde que nos anos oitenta, com Pierre Trudeau, foi promulgada legislação que apoia e facilita a integração de todos os novos imigrantes no país de acolhimento
independentemente de sua origem étnica, língua de origem, religião, etc. (Canadian Multiculturalism Act, 1988, c. 31, assented to 21st July, 1988).
Quando me foi proposto pela Associação MULHER MIGRANTE organizar, emToronto, um encontro sobre o impacto do 25 de Abril e do início da democracia em Portugal na diáspora portuguesa, pensei imediatamente em tentar dar voz a um grupo de imigrantes de origem portuguesa vindos das ex-colónias para o Canadá. Sabe-se que angolanos, moçambicanos e cabo-verdianos procuraram o Canadá depois da
descolonização. Pouco está publicado sobre este tipo de estatísticas, ou acerca dos obstáculos que eventualmente terão encontrado estes expatriados e quais os meios usados para a sua integração na comunidade canadiana.
Não foi o nosso objetivo fazer um estudo deste grupo migratório. Tentámos sim, dar um primeiro passo para o abordar. Conseguimos reunir à mesma mesa dois participantes que deram seu testemunho: Elisabete Branco de Moçambique e José Carvalho de Angola. No ambiente informal proporcionado pelo Encontro, foram-lhes feitas perguntas cujas respostas estão incluídas nos depoimentos abaixo apresentados.
Elisabete Branco afirmou: Vim para o Canadá com os meus pais e uma irmã de cinco anos de idade, tinha eu quatorze. Saímos de Vila Pery, Chimoio, Moçambique em Fevereiro de 1975. Viemos de Arcos de
Valdevez, no Minho, , a 22 de Setembro de 1976.
Escolhemos o Canadá como país de acolhimento porque a minha mãe tinha dois irmãos do meu avô a viver um em Ottawa, Ontário, e outro em Fredericton, New Brunswick.
Tivemos vários e grandes problemas de adaptação: em primeiro lugar o clima, a língua, num país multicultural onde cada nacionalidade vivia muito individualmente. Fui até uma das primeiras fundadoras do rancho folclórico minhoto em Toronto com quinze anos de idade. Vinda de terras de batuque, aprendia agora a dançar folclore minhoto, quais não eram as saudades da minha bandeira!
O que mais facilitou a nossa integração foi o facto de ter o meu avô materno já a viver no Canadá desde 1970 e a maior parte desses anos em Toronto. Havia também na escola uma meia dúzia de colegas portugueses - o que era o nosso elo de ligação à nossa bandeira -, mas nem sempre partilhávamos os mesmos usos e costumes propriamente ditos. Preciso lembrar que embora todos nós, crianças portuguesas, erámos de cantos diferentes: a Maria Gouveia era da Terceira, o João Sousa de Angola, a Lasalete
Moreira nascida em França tinha vindo de Laúndos, Póvoa de Varzim e a Maria Bettencourt do Funchal. Uns já dominavam melhor a língua inglesa e auxiliavam os portugueses recém-chegados, no entanto, embora portugueses éramos diferentes. (Hoje sinto-me abençoada e mais rica por ter tido essas mesmas experiências na altura difíceis, mas que me deram uma riqueza cultural não estudada, mas sim vivida e sentida).
Sinto-me diferente por ter vivido em África mas não só relativamente aos outros portugueses mas sim a todas as pessoas em geral. Africa não se consegue explicar, todo o ser humano olhará para o mundo diferente depois de ter visitado África! Sei que vou voltar a Moçambique um dia e em breve, tenho
que me despedir, porque há trinta e nove anos atrás não me deram tempo de dizer ADEUS!
Sinto-me canadiana perante outras nacionalidades, mas sinto-me muito portuguesa quando estou com a minha gente. Nunca me senti africana mas Moçambique será para sempre a minha maior paixão. (Ao escrever estas palavras as lágrimas correm-me pelorosto abaixo).
Tive dois anos de ensino superior, tirei o curso de viagens e turismo, o qual continuo a exercer.
Acrescento o meu agradecimento a todos que continuam a divulgar e reconhecem que os retornados eram e são filhos da Pátria-Mãe, eram felizes além-mar e não queriam retornar.
José Luís Roque Paiva Carvalho testemunhou: Sou angolano de segunda geração por parte de mãe, nascido e criado em Luanda até quase aos 20 anos. Saí de Angola em 1975, um mês antes de completar os 20 anos, primariamente com a intenção de continuar a minha educação. Tinha quase terminado o primeiro ano de Universidade em Luanda (engenharia civil) quando as instituições académicas deixaram de funcionar regularmente. Apresentaram-se-me várias opções, pois tinha família em Portugal, Brasil e Canadá.
Confesso que a perspectiva de ir para o Canadá era a mais excitante, pois além da expectativa de uma educação em instituições de renome internacional, tinha também um sabor de aventura. Na realidade, o que fez a decisão ser mais fácil foi o facto de ter família que eu conhecia bem e com quem tinha um grande à vontade. O meu tio e padrinho de baptismo - que viveu em Angola perto da minha família enquanto solteiro e com quem eu tive um convívio quase diário enquanto criança -, residia no Canadá já há alguns anos. A importância da família não pode ser subestimada. O meu tio chegou a ter 10 pessoas de família vindas do ultramar em sua casa durante alguns meses, além da sua própria família, até elas se integrarem no Canadá.
O meu plano inicial era terminar a minha educação e voltar para Angola, mas foi óbvio muito rapidamente que essa possibilidade se tornava cada vez mais remota. Nesse sentido, a decisão de me radicar no Canadá foi-me simplificada e muito fácil de tomar. A integração na sociedade canadiana foi relativamente fácil, pois eu já falava bem inglês e francês e, com a oportunidade de continuar a estudar, consolidei o domínio da língua muito depressa.
Apesar de ter optado pela cidadania canadiana assim que me foi permitido, nunca deixei de me sentir Português, pois 20 anos de cultura portuguesa não se perdem de um dia para o outro; eu diria até nunca. Contudo, o período que eu tive mais chegado à comunidade portuguesa, mais especificamente à comunidade angolana no Canadá, foi durante os poucos anos de existência de uma associação de emigrados das ex-colónias portuguesas, chamada “Imbondeiro”. Entre os anos de 1978 – 1981, se a memória não me falha, alguns imigrantes portugueses do ultramar resolveram juntar-se e criar uma associação com o fim de não só conviverem e preservarem as suas vivências e cultura africanas, mas também com a finalidade de se entreajudarem e ajudarem novos imigrantes do ultramar. Esta organização teve um papel extremamente importante nas vidas de muitos imigrantes, especialmente nos seus primeiros anos no Canadá, pondo-os em contacto com outros portugueses em posição de lhes arranjar trabalho, alojamento,etc.. Conservo memórias muito boas dessa época e fiz muitos bons amigos com quem ainda hoje convivo. Como todas as organizações, quando deixou de ter este papel importante, dissolveu-se.
Com respeito a voltar a África, eu resolvi seguir o conselho do meu pai e não voltar, mesmo que fosse só em visita. Essa é a maneira de preservar as memórias duma infância e adolescência muito felizes e livres num país onde eu hoje talvez tivesse dificuldade de reconhecer. É certo que não se pode esconder a situação em que se encontra hoje Angola, mas é muito diferente ver o que se passa nas notícias e ter que vivê-las em
primeira mão.
Hoje sinto-me verdadeiramente canadiano, sem nunca perder as minhas raízes lusitanas, e creio que é possível sentir orgulho pelos dois países simultaneamente. O Canadá ofereceu-me oportunidades iguais às dos filhos da terra e por isso sempre senti que faço parte desta sociedade. Formei-me em engenharia civil pela Universidade de Toronto em 1982 e continuei a estudar na universidade onde acabei por obter diplomas de mestrado e doutorado. Fiz uma pequena escapada aos Estados Unidos por dois anos (1988 e 1989, para trabalhar na indústria do petróleo, mas na verdade, o Canadá é o país que me estava no coração, e logo decidi voltar.
À laia de conclusão
Quer a Elisabete quer o José não se consideram representantes dos moçambicanos ou angolanos que escolheram o Canadá. Penso, todavia, que estes depoimentos ajudam a ilustrar algumas das questões que surgem ao refletirmos sobre a vinda deste grupo específico de pessoas, imigrantes de origem portuguesa que viviam em África e foram forçados a deixar esse velho continente. E, ao escolher o Canadá, deram com um país novo e democrático que lhes permitiu ter um futuro com esperança e que os ajudou, de alguma forma, a esquecer alguns dos traumas da descolonização.
Manuela Marujo
Elisabete Branco
José Carvalho
independentemente de sua origem étnica, língua de origem, religião, etc. (Canadian Multiculturalism Act, 1988, c. 31, assented to 21st July, 1988).
Quando me foi proposto pela Associação MULHER MIGRANTE organizar, emToronto, um encontro sobre o impacto do 25 de Abril e do início da democracia em Portugal na diáspora portuguesa, pensei imediatamente em tentar dar voz a um grupo de imigrantes de origem portuguesa vindos das ex-colónias para o Canadá. Sabe-se que angolanos, moçambicanos e cabo-verdianos procuraram o Canadá depois da
descolonização. Pouco está publicado sobre este tipo de estatísticas, ou acerca dos obstáculos que eventualmente terão encontrado estes expatriados e quais os meios usados para a sua integração na comunidade canadiana.
Não foi o nosso objetivo fazer um estudo deste grupo migratório. Tentámos sim, dar um primeiro passo para o abordar. Conseguimos reunir à mesma mesa dois participantes que deram seu testemunho: Elisabete Branco de Moçambique e José Carvalho de Angola. No ambiente informal proporcionado pelo Encontro, foram-lhes feitas perguntas cujas respostas estão incluídas nos depoimentos abaixo apresentados.
Elisabete Branco afirmou: Vim para o Canadá com os meus pais e uma irmã de cinco anos de idade, tinha eu quatorze. Saímos de Vila Pery, Chimoio, Moçambique em Fevereiro de 1975. Viemos de Arcos de
Valdevez, no Minho, , a 22 de Setembro de 1976.
Escolhemos o Canadá como país de acolhimento porque a minha mãe tinha dois irmãos do meu avô a viver um em Ottawa, Ontário, e outro em Fredericton, New Brunswick.
Tivemos vários e grandes problemas de adaptação: em primeiro lugar o clima, a língua, num país multicultural onde cada nacionalidade vivia muito individualmente. Fui até uma das primeiras fundadoras do rancho folclórico minhoto em Toronto com quinze anos de idade. Vinda de terras de batuque, aprendia agora a dançar folclore minhoto, quais não eram as saudades da minha bandeira!
O que mais facilitou a nossa integração foi o facto de ter o meu avô materno já a viver no Canadá desde 1970 e a maior parte desses anos em Toronto. Havia também na escola uma meia dúzia de colegas portugueses - o que era o nosso elo de ligação à nossa bandeira -, mas nem sempre partilhávamos os mesmos usos e costumes propriamente ditos. Preciso lembrar que embora todos nós, crianças portuguesas, erámos de cantos diferentes: a Maria Gouveia era da Terceira, o João Sousa de Angola, a Lasalete
Moreira nascida em França tinha vindo de Laúndos, Póvoa de Varzim e a Maria Bettencourt do Funchal. Uns já dominavam melhor a língua inglesa e auxiliavam os portugueses recém-chegados, no entanto, embora portugueses éramos diferentes. (Hoje sinto-me abençoada e mais rica por ter tido essas mesmas experiências na altura difíceis, mas que me deram uma riqueza cultural não estudada, mas sim vivida e sentida).
Sinto-me diferente por ter vivido em África mas não só relativamente aos outros portugueses mas sim a todas as pessoas em geral. Africa não se consegue explicar, todo o ser humano olhará para o mundo diferente depois de ter visitado África! Sei que vou voltar a Moçambique um dia e em breve, tenho
que me despedir, porque há trinta e nove anos atrás não me deram tempo de dizer ADEUS!
Sinto-me canadiana perante outras nacionalidades, mas sinto-me muito portuguesa quando estou com a minha gente. Nunca me senti africana mas Moçambique será para sempre a minha maior paixão. (Ao escrever estas palavras as lágrimas correm-me pelorosto abaixo).
Tive dois anos de ensino superior, tirei o curso de viagens e turismo, o qual continuo a exercer.
Acrescento o meu agradecimento a todos que continuam a divulgar e reconhecem que os retornados eram e são filhos da Pátria-Mãe, eram felizes além-mar e não queriam retornar.
José Luís Roque Paiva Carvalho testemunhou: Sou angolano de segunda geração por parte de mãe, nascido e criado em Luanda até quase aos 20 anos. Saí de Angola em 1975, um mês antes de completar os 20 anos, primariamente com a intenção de continuar a minha educação. Tinha quase terminado o primeiro ano de Universidade em Luanda (engenharia civil) quando as instituições académicas deixaram de funcionar regularmente. Apresentaram-se-me várias opções, pois tinha família em Portugal, Brasil e Canadá.
Confesso que a perspectiva de ir para o Canadá era a mais excitante, pois além da expectativa de uma educação em instituições de renome internacional, tinha também um sabor de aventura. Na realidade, o que fez a decisão ser mais fácil foi o facto de ter família que eu conhecia bem e com quem tinha um grande à vontade. O meu tio e padrinho de baptismo - que viveu em Angola perto da minha família enquanto solteiro e com quem eu tive um convívio quase diário enquanto criança -, residia no Canadá já há alguns anos. A importância da família não pode ser subestimada. O meu tio chegou a ter 10 pessoas de família vindas do ultramar em sua casa durante alguns meses, além da sua própria família, até elas se integrarem no Canadá.
O meu plano inicial era terminar a minha educação e voltar para Angola, mas foi óbvio muito rapidamente que essa possibilidade se tornava cada vez mais remota. Nesse sentido, a decisão de me radicar no Canadá foi-me simplificada e muito fácil de tomar. A integração na sociedade canadiana foi relativamente fácil, pois eu já falava bem inglês e francês e, com a oportunidade de continuar a estudar, consolidei o domínio da língua muito depressa.
Apesar de ter optado pela cidadania canadiana assim que me foi permitido, nunca deixei de me sentir Português, pois 20 anos de cultura portuguesa não se perdem de um dia para o outro; eu diria até nunca. Contudo, o período que eu tive mais chegado à comunidade portuguesa, mais especificamente à comunidade angolana no Canadá, foi durante os poucos anos de existência de uma associação de emigrados das ex-colónias portuguesas, chamada “Imbondeiro”. Entre os anos de 1978 – 1981, se a memória não me falha, alguns imigrantes portugueses do ultramar resolveram juntar-se e criar uma associação com o fim de não só conviverem e preservarem as suas vivências e cultura africanas, mas também com a finalidade de se entreajudarem e ajudarem novos imigrantes do ultramar. Esta organização teve um papel extremamente importante nas vidas de muitos imigrantes, especialmente nos seus primeiros anos no Canadá, pondo-os em contacto com outros portugueses em posição de lhes arranjar trabalho, alojamento,etc.. Conservo memórias muito boas dessa época e fiz muitos bons amigos com quem ainda hoje convivo. Como todas as organizações, quando deixou de ter este papel importante, dissolveu-se.
Com respeito a voltar a África, eu resolvi seguir o conselho do meu pai e não voltar, mesmo que fosse só em visita. Essa é a maneira de preservar as memórias duma infância e adolescência muito felizes e livres num país onde eu hoje talvez tivesse dificuldade de reconhecer. É certo que não se pode esconder a situação em que se encontra hoje Angola, mas é muito diferente ver o que se passa nas notícias e ter que vivê-las em
primeira mão.
Hoje sinto-me verdadeiramente canadiano, sem nunca perder as minhas raízes lusitanas, e creio que é possível sentir orgulho pelos dois países simultaneamente. O Canadá ofereceu-me oportunidades iguais às dos filhos da terra e por isso sempre senti que faço parte desta sociedade. Formei-me em engenharia civil pela Universidade de Toronto em 1982 e continuei a estudar na universidade onde acabei por obter diplomas de mestrado e doutorado. Fiz uma pequena escapada aos Estados Unidos por dois anos (1988 e 1989, para trabalhar na indústria do petróleo, mas na verdade, o Canadá é o país que me estava no coração, e logo decidi voltar.
À laia de conclusão
Quer a Elisabete quer o José não se consideram representantes dos moçambicanos ou angolanos que escolheram o Canadá. Penso, todavia, que estes depoimentos ajudam a ilustrar algumas das questões que surgem ao refletirmos sobre a vinda deste grupo específico de pessoas, imigrantes de origem portuguesa que viviam em África e foram forçados a deixar esse velho continente. E, ao escolher o Canadá, deram com um país novo e democrático que lhes permitiu ter um futuro com esperança e que os ajudou, de alguma forma, a esquecer alguns dos traumas da descolonização.
Manuela Marujo
Elisabete Branco
José Carvalho
segunda-feira, 8 de dezembro de 2014
DEOLINDA ADÃO Califórnia, Madrasta dos meus filhos
È difícil saber se as coisas inesperadas são frequentemente maravilhosas por serem excecionais
ou simplesmente por serem inesperadas. Seja como for, este texto é sem dúvida um caso de algo
inesperado e maravilhoso. Numa manhã ensolarada, O Professor Donald Warrin e eu saímos de
Berkeley devidamente equipados para gravar as histórias orais do Casal Câmara (José e Joanne)
residentes em Hayward Califórnia, ambos com longos anos de voluntariado em prol de diversas
organizações Portuguesas tanto fraternais como culturais. Sabíamos de antemão que Joanne era
uma historiadora por natureza, aliás foi Joanne Câmara que compilou as edições editadas por
duas Sociedades Fraternais Portuguesas da Califórnia (a UPEC e a UPPEC) na ocasião dos seus
respetivos Centenários. Assim, um dos nossos objetivos era no âmbito da entrevista indagar
sobre o processo de investigação e as fontes consultadas para as referidas compilações. No
entanto, quando casualmente Joanne nos informa que acabara de reunir e traduzir um grupo de
cartas que encontrara na casa de seus pais quando se dedicava a penosa tarefa de a preparar para
ser vendida após o falecimento de sua mãe, a nossa curiosidade foi quase incontrolável. Mas
nada nos podia preparar para o que estava prestes a chegar as nossas mãos. Uma vez terminada a
entrevista, Joanne foi buscar a compilação dizendo-nos: “vou buscar a Maria Inácia. Encontrei as
cartas que ela escrevia dos Açores para os seus filhos (meu pai e meus tios) residentes na
Califórnia, estavam numa caixa muito bonita, daquelas decoradas com flores em estilo Vitoriano,
fiquei muito emocionada quando as li, e resolvi traduzi-las para que os meus netos pudessem ter
conhecimento dos sentimentos mais íntimos da sua trisavó.” Esta pequena frase teve um efeito
quase estonteante, especialmente pensando toda esta dinâmica dentro de uma perspetiva de
construção de identidade feminina, em que uma mulher desenterra e traz à luz os pensamentos e
preocupações de uma das suas antepassadas, reconstrói as suas palavras através do processo de
tradução e projeta-a para o futuro para as gerações vindouras.
Para além de todo o inerente valor histórico e social das cartas em questão, este processo
de renascimento de Maria Inácia pelas mãos da sua neta Joanne, que por sua vez pretende
transmitir essa voz aos seus netos, e que efetivamente une cinco gerações, é extremamente
simbólica a diversos níveis.
Num texto que publicamos previamente, defendemos que tal como declara o filósofo
John Searle no seu emblemático texto The Construction of Social Reality (A Contrução da
Realidade Social) cada sociedade constrói uma rede de dogmas que servirão de parâmetros de
identidade vem a ser incorporados e propagados por cada membro da sociedade em questão,
eventualmente construindo-se em “realidade” ou “verdade” social e cultural. Também nesse
mesmo texto, e ainda de acordo com o trabalho de Searle, desta vez desenvolvido no texto
Expressions and Meaning - Study in the Theory of Speech Acts (Expressão e Significado –
Estudos no Âmbito da Teoria de Enunciação) que desenvolve o poder de construção das palavras
e por extensão da escrita, e estabelece uma relação entre o acto elocutório e o texto literário, ou
seja a escrita. Esta relação acaba por ser um dos centros de debate no texto Gender Trouble de
Judith Butler, no qual a autora defende que “a linguagem tem o poder de criar «realidade social»
através de locuções de agentes enunciadores” Assim, se Maria Inácia se auto constrói através das
cartas que escreve, Joanne Câmara constrói-se a si própria apropriando-se da voz de sua avó e
reconstruindo-a pelo processo da compilação e tradução. É pois precisamente esta cadeia de
construção que representa um dos elementos a ter em consideração durante a leitura do texto que
aqui apresentamos.
Obviamente, o teor histórico e social, tanto da Ilha Terceira nos Açores, como da
Califórnia, é outra faceta de grande interesse para historiadores e sociólogos pois poucos
testemunhos deste tipo, especialmente com o nível crítico e analítico das cartas em que a sua
autora agilmente tece conselhos maternais, pensamentos íntimos, eventos históricos e relações ou
coscuvilhices comunitárias, chegam aos nossos dias. Como tal, as cartas aqui compiladas
representam documentos únicos e preciosos para todos aqueles interessados em temas histórico-
sociais. As cartas escritas entre 1908 e 1919 são importantíssimas pois durante este período
tanto Europa como Os Estados Unidos e especificamente a Califórnia, atravessavam momentos
conturbados como o Colapso da Monarquia e início da Primeira Republica em Portugal, a Primeira
Guerra Mundial, Aumento da comunidade Portuguesa da Califórnia e subsequente decréscimo e
desenvolvimento e ainda inúmeras Alterações nas leis de emigração dos Estados Unidos principalmente
a lei da literacia que exigia que todos os emigrantes maiores de 16 anos que entrassem os Estados
Unidos, tinha que ser letrados na sua língua materna.
Finalmente, as cartas em questão são reveladoras do grande amor que unia Maria Inácia e
seus filhos, todos emigrados para a Califórnia, longe da vista, mas definitivamente nunca longe
do coração. Afinal, é esse o legado que Joanne quer passar a seus netos o amor que une cinco
gerações de uma família, quebrando todss as limitações de tempo e espaço, e que tal como as
cartas de Maria Inácia, atravessa mais de um século e cruza um oceano e um continente.
Efetivamente, esta publicação subverte todos os limites, pois inserem tanto avó como neta na
esfera da eternidade.
A leitura das cartas leva-nos à intimidade da família Vaz ou mais precisamente:
Maria Ignacia Cotta Menezes Vaz
Manuel Vaz (filho de Maria Ignacia)
Evaristo Vaz (filho de Maria Ignacia)
Jose Vaz (filho de Maria Ignacia)
Ezequiel Vaz (filho de Maria Ignacia)
Augusto Vaz (filho de Maria Ignacia)
Assim como o núcleo familiar da irmã de Maria Ignacia ou seja Francisco, Adelaide e Clemente
Lemos.
ou simplesmente por serem inesperadas. Seja como for, este texto é sem dúvida um caso de algo
inesperado e maravilhoso. Numa manhã ensolarada, O Professor Donald Warrin e eu saímos de
Berkeley devidamente equipados para gravar as histórias orais do Casal Câmara (José e Joanne)
residentes em Hayward Califórnia, ambos com longos anos de voluntariado em prol de diversas
organizações Portuguesas tanto fraternais como culturais. Sabíamos de antemão que Joanne era
uma historiadora por natureza, aliás foi Joanne Câmara que compilou as edições editadas por
duas Sociedades Fraternais Portuguesas da Califórnia (a UPEC e a UPPEC) na ocasião dos seus
respetivos Centenários. Assim, um dos nossos objetivos era no âmbito da entrevista indagar
sobre o processo de investigação e as fontes consultadas para as referidas compilações. No
entanto, quando casualmente Joanne nos informa que acabara de reunir e traduzir um grupo de
cartas que encontrara na casa de seus pais quando se dedicava a penosa tarefa de a preparar para
ser vendida após o falecimento de sua mãe, a nossa curiosidade foi quase incontrolável. Mas
nada nos podia preparar para o que estava prestes a chegar as nossas mãos. Uma vez terminada a
entrevista, Joanne foi buscar a compilação dizendo-nos: “vou buscar a Maria Inácia. Encontrei as
cartas que ela escrevia dos Açores para os seus filhos (meu pai e meus tios) residentes na
Califórnia, estavam numa caixa muito bonita, daquelas decoradas com flores em estilo Vitoriano,
fiquei muito emocionada quando as li, e resolvi traduzi-las para que os meus netos pudessem ter
conhecimento dos sentimentos mais íntimos da sua trisavó.” Esta pequena frase teve um efeito
quase estonteante, especialmente pensando toda esta dinâmica dentro de uma perspetiva de
construção de identidade feminina, em que uma mulher desenterra e traz à luz os pensamentos e
preocupações de uma das suas antepassadas, reconstrói as suas palavras através do processo de
tradução e projeta-a para o futuro para as gerações vindouras.
Para além de todo o inerente valor histórico e social das cartas em questão, este processo
de renascimento de Maria Inácia pelas mãos da sua neta Joanne, que por sua vez pretende
transmitir essa voz aos seus netos, e que efetivamente une cinco gerações, é extremamente
simbólica a diversos níveis.
Num texto que publicamos previamente, defendemos que tal como declara o filósofo
John Searle no seu emblemático texto The Construction of Social Reality (A Contrução da
Realidade Social) cada sociedade constrói uma rede de dogmas que servirão de parâmetros de
identidade vem a ser incorporados e propagados por cada membro da sociedade em questão,
eventualmente construindo-se em “realidade” ou “verdade” social e cultural. Também nesse
mesmo texto, e ainda de acordo com o trabalho de Searle, desta vez desenvolvido no texto
Expressions and Meaning - Study in the Theory of Speech Acts (Expressão e Significado –
Estudos no Âmbito da Teoria de Enunciação) que desenvolve o poder de construção das palavras
e por extensão da escrita, e estabelece uma relação entre o acto elocutório e o texto literário, ou
seja a escrita. Esta relação acaba por ser um dos centros de debate no texto Gender Trouble de
Judith Butler, no qual a autora defende que “a linguagem tem o poder de criar «realidade social»
através de locuções de agentes enunciadores” Assim, se Maria Inácia se auto constrói através das
cartas que escreve, Joanne Câmara constrói-se a si própria apropriando-se da voz de sua avó e
reconstruindo-a pelo processo da compilação e tradução. É pois precisamente esta cadeia de
construção que representa um dos elementos a ter em consideração durante a leitura do texto que
aqui apresentamos.
Obviamente, o teor histórico e social, tanto da Ilha Terceira nos Açores, como da
Califórnia, é outra faceta de grande interesse para historiadores e sociólogos pois poucos
testemunhos deste tipo, especialmente com o nível crítico e analítico das cartas em que a sua
autora agilmente tece conselhos maternais, pensamentos íntimos, eventos históricos e relações ou
coscuvilhices comunitárias, chegam aos nossos dias. Como tal, as cartas aqui compiladas
representam documentos únicos e preciosos para todos aqueles interessados em temas histórico-
sociais. As cartas escritas entre 1908 e 1919 são importantíssimas pois durante este período
tanto Europa como Os Estados Unidos e especificamente a Califórnia, atravessavam momentos
conturbados como o Colapso da Monarquia e início da Primeira Republica em Portugal, a Primeira
Guerra Mundial, Aumento da comunidade Portuguesa da Califórnia e subsequente decréscimo e
desenvolvimento e ainda inúmeras Alterações nas leis de emigração dos Estados Unidos principalmente
a lei da literacia que exigia que todos os emigrantes maiores de 16 anos que entrassem os Estados
Unidos, tinha que ser letrados na sua língua materna.
Finalmente, as cartas em questão são reveladoras do grande amor que unia Maria Inácia e
seus filhos, todos emigrados para a Califórnia, longe da vista, mas definitivamente nunca longe
do coração. Afinal, é esse o legado que Joanne quer passar a seus netos o amor que une cinco
gerações de uma família, quebrando todss as limitações de tempo e espaço, e que tal como as
cartas de Maria Inácia, atravessa mais de um século e cruza um oceano e um continente.
Efetivamente, esta publicação subverte todos os limites, pois inserem tanto avó como neta na
esfera da eternidade.
A leitura das cartas leva-nos à intimidade da família Vaz ou mais precisamente:
Maria Ignacia Cotta Menezes Vaz
Manuel Vaz (filho de Maria Ignacia)
Evaristo Vaz (filho de Maria Ignacia)
Jose Vaz (filho de Maria Ignacia)
Ezequiel Vaz (filho de Maria Ignacia)
Augusto Vaz (filho de Maria Ignacia)
Assim como o núcleo familiar da irmã de Maria Ignacia ou seja Francisco, Adelaide e Clemente
Lemos.
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