terça-feira, 10 de janeiro de 2012

GRAÇA SOUSA GUEDES

AS MULHERES PORTUGUESAS NO MUNDO
a Dança no diálogo intercultural

Prof. Doutora Maria da Graça Sousa Guedes
Professora Catedrática do ISCS-N
gracaguedes@net.sapo.pt

INTRODUÇÃO

O comportamento social da mulher e o desenvolvimento dos mecanismos responsáveis pelo seu ajustamento, ocorre em função da cultura, que parece funcionar como elemento determinante do seu bem – estar.
Num diálogo intercultural, as mulheres e as jovens da diáspora portuguesa têm utilizado actividades corporais em forma de DANÇA, que é dinamizada nas Associações portuguesas espalhadas pelo mundo.
Dançando o nosso património cultural, preservam-no, valorizam-no e divulgam-no, numa participação espontânea, alegre, activa, motivadora e paritária, que importa não ser interrompido pelas novas gerações.
Para que os jovens e as jovens de origem portuguesa continuem a desempenhar este papel, é necessário providenciar motivações, com actividades adequadas e atractivas, para que frequentem estes espaços portugueses e continuem o papel desempenhado pelos seus pais, com igual dinamismo e vontade de preservar a língua e a cultura portuguesa.

CORPORALIDADE VERSUS GÉNERO FEMININO

A auto-estima e o auto-conceito, de mulher ocidental reflecte o efeito de uma forte influência social, seguido como fonte de possíveis desajustamentos ou de conflitos interpessoais, com repercussões na sua imagem corporal e na sua saúde mental.
É cada vez maior o número de mulheres que recorrem à prática de actividades físicas, com a finalidade de encontrarem o seu bem-estar psicológico e assim combaterem os efeitos de conflitos internos e de pressões causadas pelo modelo social, que se traduzem em ansiedade, depressão, folias, alterações negativas de humor, do auto-conceito e de auto-estima.
Para Altermann & Saole (2000), os níveis baixos de auto-estima podem conduzir a patologias diversas, comprometendo a qualidade de vida, para além de interferirem nos níveis de satisfação com a vida.
As diferenças de género, que estão bem impressas nas estruturas sociais e mentais (Bordieu, 1996), parecem potenciar-se no âmbito de actividade física e do desporto.
Verifica-se o desenvolvimento de atitudes preconceituosas e de estereótipos de género, que são limitadores na construção de feminilidade e de masculinidade. Incutem, subtilmente, a ideia de uma imagem hegemónica masculina, expressa num padrão legitimo de masculinidade (Botelho Gomes et al. , 2002)
Ora é a Escola que deve atender à pluralidade de cultura que caracteriza o desporto e, segundo Thoberge (1991), à sua irrisória mentalidade na construção dos géneros. Esta falha mentalidade do Desporto, lidando com os alunos e as alunas da mesma maneira, numa errónea suposição de que assim se atinge a justiça e a igualdade de oportunidades, tem inquinado a educação. Esta falsa mentalidade é contrariada por Patrício (1990), que afirma categoricamente que educamos personalidades irrepetíveis e que nos projectos individuais de existência, devem estar incluídos os diversos saberes e culturas.
A Escola tem efectivamente de respeitar e de implementar os princípios de equidade, que assegurem justeza e justiça no processo educativo. E, assim sendo, a Actividade Física e o Desporto devem propiciar a auto-estima e a competência, de forma a que seja percebida pelos alunos e pelas alunas, de modo que todos e não importa o género, vejam estas práticas corporais como actividades incluídas no seu quotidiano e que devem permanecer ao longo das suas vidas. E, para tal, é fundamental que tenham prazer ao praticá-las.
Hoje são consensuais as noções de que a actividade física regular assume um papel relevante na promoção de um estilo de vida saudável e de que níveis elevados de actividade de uma participação similar quando adultos.
E esta prática regular de actividade física acontece naturalmente na mulher da diáspora portuguesa quando dança as nossas tradições, para afirmação e divulgação da cultura portuguesa no mundo dinamizada nas suas associações.
As danças, assim como cantares, constituem um património cultural extremamente rico e diversificado, com o qual os portugueses da diáspora se identificam e se formam agentes de preservação das suas tradições.
Interpretam-nas com um grande prazer e orgulho, na certeza de estarem a contribuir para que sejam mantidas vivas as suas raízes e, consequentemente, fortalecerem o diálogo entre os dois universos que os condicionam.
E nelas podem participar todos, não importa a idade e o género. Mesmo quando não dançam, fazem parte dos coros ou dos grupos instrumentais que as acompanham.

A MULHER DA DIÁSPORA PORTUGUESA E O DIÁLOGO INTERCULTURAL
O associativismo na diáspora portuguesa constituiu uma forma de conjugar indivíduos com interesses ou gostos análogos, que tem favorecido a implementação de objectivos comuns: convivência social, prossecução de práticas culturais, recreativas e desportivas, para além da defesa de interesses nos centros de saúde, do trabalho, das condições de vida, da política (Guedes, 1995).
As Associações portuguesas espalhadas pelo mundo, podem efectivamente ser consideradas como um processo globalizante de interpretações sociais e um meio privilegiado para o estabelecimento de um diálogo intercultural, que se alicerça no fortalecimento dos seus próprios valores culturais.
O elevado número de associações que abrange todos os continentes, reflecte a espontânea necessidade em manter e cultivar a sua própria identidade, de forma a criar mecanismos próprios para defesa dos seus interesses, bem como para manifestar uma presença activa no país de acolhimento.
Nestes espaços de convívio que os portugueses criaram em todo o mundo e que se destinam à sua sobrevivência cultural, são desenvolvidos diferentes tipos de actividades. Pode haver algumas diferenças, dependentes das suas motivações, mas em quase todas há Desporto e há Folclore.
Tive a oportunidade de conhecer uma grande parte de Associações na Europa (França e Suiça), em África (Zaire e África do Sul), na América do Norte e Central (EUA, Canadá e Panamá), na América do Sul (Brasil, Venezuela, Uruguai e Argentina), na Ásia (Malaca) e de trabalhar com os Grupos de Folclore, reconhecendo um empenho extraordinário de todos e uma vontade de melhorar e aumentar os seus reportórios.
Reflectindo uma Cultura Motora inerente às suas vivências e às suas memórias, procuravam reproduzi-las com rigôr. Com todos eles procurei corrigir alguns defeitos, melhorar as suas prestações, adequar as coreografias e os passos inerentes às Danças portuguesas, ampliar os reportórios bem como as músicas e os instrumentos a que recorriam. Foi uma tarefa extremamente enriquecedora que vivenciei e, se em alguns casos, o tempo de duração foi favorável, tal como no Uruguai e em Malaca (15 dias), nos outros casos foi menos intenso, mas a dedicação de todos e em regime pós-laboral, propiciou excelentes progressos.
Estas acções foram reconhecidas pela minha Faculdade – Educação Física e Desporto da Universidade do Porto – e expressas em diplomas entregues a todos os participantes.
No Encontro Mundial de Mulheres Migrantes, realizado em Espinho em 1995, apresentei um estudo que realizei acerca do papel do Folclore na aculturação dos povos, no qual foram quantificados os grupos então existentes nas Associações e distribuídos pelos continentes (Quadro nº. 1).

Quadro nº 1 - Grupos de Folclore nas Associações Portuguesas

CONTINENTES ASSOCIAÇÕES GRUPOS DE FOLCLORE
EUROPA
1057 446
ÁFRICA
100 22
AMÉRICA DO NORTE
448 94
AMÉRICA CENTRAL E DO SUL
289 74
TOTAL
1894 636
Guedes, 1995

Haverá provavelmente alguma alteração nestes valores e que valerá a pena actualizar, uma vez que estão decorridos já bastantes anos. E, complementarmente, conhecer mais acerca das modalidades desportivas existentes, quantidade de participantes envolvidos e distribuídos em função do género e idade.

O Folclore, é efectivamente praticado em quase um terço das Associações. E, porque as danças portuguesas são caracterizadamente realizadas aos pares, há necessariamente uma participação com paridade entre géneros.
Para além destas práticas corporais constituírem um celeiro de novas sementes, que fertilizam a dinâmica corporal expressa em dança, há também relações de género.
Há educação estética, como processo formativo do ser humano, mas também como processo de abertura e de ampliação das capacidades de sinalização para aceite, em relação ao outro (género) e em relação ao mundo (educação) que não pode ser desvalorizado nem interrompido, com uma participação cada vez maior e atractiva para os mais novos.
No Desporto, a participação feminina não será significativa, não porque tenham sido levantados dados relativos a este tipo de envolvência, mas por conhecimento pessoal obtido nas visitas às Associações.
As jovens e as mulheres portuguesas dançam o nosso património cultural, preservando-o e divulgando-o, numa participação espontânea, alegre, activa, motivadora e paritária.
Há certamente muitas jovens que praticam desportos e ao mais elevado nível, como também de outras actividades culturais. Estarão provavelmente distantes da comunidade portuguesa e não utilizam as suas performances para atraírem e motivarem os mais novos para as práticas que dominam. Mas estas jovens podem ser agentes excelentes para as dinamizarem nas Associações portuguesas.
Consequentemente, estes espaços ficariam enriquecidos com a presença constante das novas gerações e de novas actividades, que arrastariam os amigos e potencializariam cada vez mais estes magníficos espaços portugueses espalhados pelo mundo.
Para tal, importa que as suas Direcções consciencializem a importância destes contributos, que irão dar continuidade ao contributo notável que têm dado para a concretização de um processo globalizante de interpretações sociais neste meio privilegiado onde se estabelece um diálogo intercultural, alicerçado no fortalecimento dos seus próprios valores culturais.

CONCLUSÃO

Apesar de ser cada vez maior o número de mulheres que recorrem à prática de actividades físicas, com a finalidade de encontrarem o seu bem-estar psicológico, a sociedade portuguesa é ainda hoje impressa de atitudes preconceituosas e de estereótipos de género, que são limitadores de uma prática desportiva feminina mais dinamizada, diversificada e divulgada.
Nas Associações, esses espaços de convívio que os portugueses criaram em todo o mundo e que se destinam à sua sobrevivência cultural, são desenvolvidos diferentes tipos de actividades, onde o desporto e o folclore são uma constante.
Se, no Desporto, a participação feminina não será significativa, no Folclore há paridade de géneros, na medida em que as danças portuguesas que praticam são realizadas aos pares, tal como é caracterizada a dança tradicional portuguesa.
As jovens e as mulheres portuguesas dançam o nosso património cultural, preservando-o e divulgando-o, numa participação espontânea, alegre, activa, motivadora e paritária.
Há certamente muitas jovens que praticam desportos e ao mais elevado nível, como também de outras actividades culturais. Estarão provavelmente distantes da comunidade portuguesa e não utilizam as suas performances para atraírem e motivarem os mais novos para as práticas que dominam. Mas estas jovens podem ser agentes excelentes para as dinamizarem nas Associações portuguesas e que importa aproveitar.
Consequentemente, estes espaços ficariam enriquecidos com a presença constante das novas gerações e de novas actividades, que arrastariam os amigos e potencializariam cada vez mais estes magníficos espaços portugueses espalhados pelo mundo.
Importa que as suas Direcções consciencializem a importância destes contributos, que irão dar continuidade ao contributo notável que têm dado para a concretização de um processo globalizante de interpretações sociais neste meio privilegiado onde se estabelece um diálogo intercultural, alicerçado no fortalecimento dos seus próprios valores culturais que tão bem sabem preservar.

BIBLIOGRAFIA
BORDIEU,P. (1999). A Dominação Masculina. Oeiras: Celta Editora.
FOX, R.K. (1998). Advances in Measurement of the Physical Self. In. J.L, Luda (Ed.), Advances in Sport and Exercise Measurement. Morgantown: Fitness Information Technology
MERLEAU-PONTY, M. (1945). Phenomenologie de La Perception. Paris : Gallimard.
SOUSA GUEDES, M.G. (1995). O Papel do Folclore na Aculturação dos Povos; os portugueses no mundo. Actas do Encontro Mundial de Mulheres Migrantes – Gerações em Diálogo. Espinho: Março de 1995.
SOUSA GUEDES, M.G. (2005). As Mulheres Portuguesas em Movimento. Encontros para a Cidadania: a igualdade entre homens e mulheres nas comunidades portuguesas - Argentina. Buenos Aires, Novembro de 2005.
SOUSA GUEDES, M.G. (2006). A não igualdade entre géneros no Desporto. Encontros para a Cidadania: a igualdade entre homens e mulheres nas comunidades portuguesas - Europa. Estocolmo, Março de 2006.

Graça Guedes
Espinho, Novembrol de 2011

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